Portugal na ONU
A Organização das Nações Unidas (ONU) foi fundada no dia 24 de outubro de 1945, na cidade de São Francisco, na Califórnia. Um ano depois Portugal pediu a adesão à organização.
As constantes recusas… até à adesão
Portugal apresentou a sua candidatura a membro de pleno direito da Organização das Nações Unidas (ONU) em 1946, tendo sido logo recusado, situação que se repetiria anualmente até 1955, ano da adesão efetiva. Apesar de apresentar a sua candidatura com base num convite de três membros permanentes do Conselho de Segurança (CS), a França, os EUA e o Reino Unido, Portugal era sempre confrontado com o veto da URSS, que fazia o mesmo a outros países candidatos (como a Áustria, a Finlândia, a Irlanda, entre outros).
Este veto inseria-se na política de confronto político e diplomático entre Moscovo e Washington do pós-guerra. A adesão de Portugal só aconteceu quando se elaborou um “pacote” (package deal) de vários países candidatos que foi negociado entre as duas super potências.
Mas a candidatura portuguesa não deixava de possuir algumas antipatias internas, como a do próprio Oliveira Salazar, que via os princípios de fundação e atuação da ONU como embaraçosos para a política colonial e internacional do regime. Temia-se o fim da integridade territorial e colonial do País e mesmo a continuidade do Estado Novo, assente no polémico “orgulhosamente sós”.
Então porque deu esse passo?
Franco Nogueira que viria a ser na década de 60 ministro dos Negócios Estrangeiros de Salazar e que já antes era membro e chefe da delegação português na ONU, na qualidade de director-geral dos Negócios Políticos e dos Negócios Estrangeiros, explica as vantagens:
Para a maioria, no início, quando a Carta foi aprovada, não eram visíveis as consequências do Capitulo XI para Portugal. Contudo o embaixador Franco Nogueira lembra que houve um homem, o general Norton de Matos, alto comissário em Angola, que conseguiu ver mais além e no final da década de 40, denunciou o Capítulo XI da Carta considerando que seria por via deste capítulo que Portugal seria atacado.
Todavia, até ao fim da década de 50, a ONU pouco alterou a política internacional portuguesa e a relação do regime com os seus territórios ultramarinos.
Colónias passam a chamar-se províncias
Uma das poucas mudanças legislativas diz respeito à designação das colónias que, através da Lei nº2048 de 11 de junho de 1951, se passaram a chamar “províncias ultramarinas”.
O Estatuto dos Indígenas
Outra mudança foi a promulgação, a 20 de maio de 1954, do novo Estatuto dos Indígenas Portugueses das províncias da Guiné, Angola e Moçambique que permitia a aquisição da cidadania portuguesa pelos indivíduos de raça negra que cumprissem uma série de requisitos legais e civilizacionais. Porém, o estatuto mantinha na prática uma segregação legal entre a esmagadora maioria dos indivíduos de raça negra e os restantes cidadãos portugueses.
As perguntas da ONU…
No dia 24 de fevereiro de 1956 o secretário geral das Nações Unidas envia aos novos membros da organização uma carta em que pergunta se administram territórios que entrem na categoria do artigo 73º da Carta.
Portugal responde dizendo que “Portugal não administra territórios que entrem na categoria indicada no artigo 73º da Carta”.
Mas o que dizia o artigo 73º da Carta das Nações Unidas?
Capítulo XI
DECLARAÇÃO RELATIVA A TERRITÓRIOS NÃO AUTÓNOMOS
Artº. 73
Os membros das Nações Unidas que assumiram ou assumam responsabilidades pela administração de territórios cujos povos ainda não se governem completamente a si mesmos reconhecem o princípio do primado dos interesses dos habitantes desses territórios e aceitam, como missão sagrada, a obrigação de promover no mais alto grau, dentro do sistema de paz e segurança internacionais estabelecido na presente Carta, o bem-estar dos habitantes desses territórios, e, para tal fim:
No final da década de 50 a descolonização torna-se num processo irreversível.
Grã-Bretanha, Bélgica, França e até a Espanha de Franco, acabam por ceder. Portugal resiste mas com a entrada de novos Estados favoráveis às independências, Portugal fica cada vez mais enfraquecido. Em 1960, 16 Estados africanos entram para a organização.
Novos passos que isolam Portugal:
Um território não autónomo era segundo as Nações Unidas, um território “tipo colonial”.
No entanto a este propósito o embaixador Franco Nogueira salienta o equívoco que existe:
Segundo Relatório dos Seis um território passa a governo próprio se:
Coube a Franco Nogueira fazer a defesa de Portugal e afirmar que os princípios do Relatório não se aplicavam a Portugal e que por isso mesmo era repudiado.
Territórios não autónomos
No dia 15 de dezembro é aprovada a resolução 1542 que declarava Cabo Verde, Guiné Portuguesa, São Tomé e dependências, São João Baptista de Ajudá, Angola incluindo Cabinda, Moçambique, Goa e dependências, Macau e dependências, Timor e dependências, territórios não autónomos sob administração portuguesa.
Portugal passava a estar obrigado a prestar informações sobre estes territórios ao Secretário Geral e era convidado juntamente com Espanha a participar no Comité de Informações Relativas aos territórios não Autónomos.
A oposição portuguesa
Portugal fez-se representar nesta votação pelo embaixador Vasco Garin e fez saber às Nações Unidas que a organização estava a reivindicar uma competência que não tinha, numa manifesta violação da Carta e discriminação de Portugal.
O início da guerra em Angola…
Com o início da luta independentista em Angola, a 4 de fevereiro de 1961, a posição portuguesa ainda fica mais fragilizada. Logo nesse mês, a 20 de fevereiro, a Libéria pede uma reunião do Conselho de Segurança para impedir a violação dos direitos humanos. Portugal reclama invocando o princípio da não ingerência nos assuntos internos mas a proposta de resolução é rejeitada.
A criação do Subcomité dos Cinco
O assunto continuou em debate e, em março, através da resolução 1603, é criado um subcomité composto por cinco membros para investigar o que se estava a passar em Angola. Pedia-se a Portugal para resolver o problema invocando os termos da Carta Anticolonialista. Em maio, 43 Estados afro-asiáticos mais a Jugoslávia pedem uma reunião urgente do Conselho de Segurança para debater a questão. O Conselho pede a Portugal para resolver o problema com urgência e simultaneamente exige que o Subcomité dos Cinco apresente as suas conclusões. Salazar chega a receber em Lisboa o representante deste grupo que no entanto não é autorizado a deslocar-se a Angola.
Um sinal de mudança…
Adriano Moreira entretanto empossado ministro do Ultramar avança com um conjunto de reformas como o fim do Estatuto dos Indígenas Portugueses das províncias da Guiné, Angola e Moçambique mas nada faz parar a pressão internacional.
A criação do Comité dos Sete
A 19 de dezembro de 1961, a assembleia Geral das Nações Unidas cria o Comité Especial para os territórios Administrados por Portugal, o Comité dos Sete. Os Estados membros eram incitados a pressionar Portugal para cumprir aquilo que as Nações Unidas consideravam como sendo as obrigações de Portugal no âmbito do capítulo XI da Carta e a recusar qualquer ajuda que pudesse ser usada contra as populações dos territórios ultramarinos.
A situação nas províncias complica-se…
Com o agravar da situação em Angola e o início da luta armada na Guiné a 23 de janeiro de 1963, há 2 resoluções que marcam a diferença de posição das Nações Unidas em relação aos chamados territórios não autónomos.
Assim:
ONU reúne com movimentos independentistas
Em junho de 1962, o Comité de Descolonização, criado em novembro de 61, reúne em Accra, recolhe informações e ouve os representantes das organizações nacionalistas das colónias: André Cassinda, da União dos Trabalhadores Angolanos, Miguel Trovoada, do Comité de Libertação de São Tomé e Príncipe e Amílcar Cabral do PAIGC. O relatório do comité com os testemunhos destes representantes foi publicado no dia 31 de agosto de 1962.
Portugal ganha o aliado americano…
É também por esta altura (agosto de 62) que os Estados Unidos invertem a sua posição relativamente a Portugal e votam contra uma resolução sobre Moçambique, no chamado Comité dos 17, bem como uma outra apresentada na Assembleia Geral de Dezembro de 1962, contra Angola. A esta mudança de posição não terá sido alheia a questão do acordo para os Açores.
Salazar viria a explicar a posição portuguesa no discurso de 12 de agosto de 1963.