"O meu nome é Lucínia Viana, tenho 31 anos. Sou Oficial Bombeira de 2ª Classe na Corporação dos Bombeiros Voluntários de Odemira.
Sou filha de pais bombeiros. Vivo desde os meus 2 anos, numa casa pegada aos Bombeiros V. de Odemira, onde o meu pai na altura era o Bombeiro quarteleiro. Sempre conheci o meu pai a dedicar mais tempo aos Bombeiros do que à familia. Tive uma infância dura. Durante muito anos tive ódio aos Bombeiros, pois fazia anos e o meu pai não estava presente por causa dos bombeiros, fazia um teatro na escola e o meu pai não estava por causa dos bombeiros, era natal e tinha que passar nos bombeiros se quisesse passá-lo com ele. Durante anos foi muito duro e eu não convivia bem com o facto de ter que dividir o meu pai com os bombeiros. Entretanto a minha mãe também foi para os bombeiros e ainda hoje lá permanece. Nessa altura, mais crescida, fui percebendo melhor o que os motivava.
Um dia percebi que só compreenderia o amor que eles sentiam pelos bombeiros se também eu fosse para os bombeiros.
Aos 14 anos tentei entrar, mas o meu pai inventou uma lei que dizia que as raparigas só poderiam entrar aos 17 anos com o objetivo de eu desistir até lá. No dia em que fiz 17 anos, já tinha toda a documentação pronta… e hoje lá estou eu, a viver um amor como nunca tinha vivido até a data.
Hoje percebo os meus pais melhor que niguém e hoje agradeço o facto de ter tido uma infância dura, que me fez crescer e dar valor a tudo o que tenho.
Vivo os Bombeiros intensamente, amo a vida de Bombeiro, não me vejo noutra profissão.
O meu pai ensinou-me que quem faz o que gosta não precisa de trabalhar um único dia, e isso é a pura da realidade: não vou para o trabalho todos os dias, vou para um dos meus amores.
Confesso que não é fácil, nem o meu percurso pelos bombeiros o tem sido. Como sempre fui muito lutadora e muito dedicada, levei muitos anos com o rótulo de que só tinha a formação que tinha por ser filha de quem era… mas infelizmente ser filha de quem sou só fez com que tivesse de provar o dobro do que os outros provaram.
O meu maior ídolo é o meu pai, que chegou a comandante depois de muita formação e hoje com 56 anos continua a fazer toda a formação que se disponibiliza na escola nacional de bombeiros. Mas tambem sofre, e muito, e é rara a entrevista que dá, ou conversa que tenha, que não verta uma lágrima por tudo o que já passou nos bombeiros.
Habituei-me muito cedo a ir para as ocorrências com o meu pai. Já passámos muito os dois… Recordo-me de situações passadas, principalmente em incêndios, pois são as que mais duram e são mais complexas. Desde estarmos cercados por incêndios, cercados por uma cheia, passarmos três dias num incêndio fora da nossa zona onde ninguém nos passava cartão e a única coisa que comemos foi um pequeno almoço oferecido por uma senhora. Desde estarmos num incêndio em Tavira e o posto de comando durante um dia inteiro pouca atenção nos dar e termos que trabalhar "à nossa sorte".
O meu pai sempre foi de arriscar a sua vida pelos outros. E eu habituei-me a isso, pois muitas vezes não era só a vida dele em risco, também era a minha. Sempre tive a ideia de que estando com o meu pai nada de mal me acontece, pois ele existe para me proteger, e só no ano passado é que tive a perfeita noção de que o meu pai não é DEUS e que mesmo estando com ele nem sempre estou protegida.
No ano passado decidi passar pelo fogo para tentar salvar uma casa, e só aí vi no que me tinha metido. Nesse momento parece que deus me enviou uma mensagem e "Corres perigo, e não és só tu. Se continuares a tua mãe ficará sozinha e o teu marido com quem te casaste há tão pouco tempo. A tua geração terminará aqui". Fiz inversão de marcha, bati com o carro e depois finalmente consegui meter-me a salvo.
Nessa noite, enquanto o meu pai decansou vinte minutos eu meditei sobre o que me tinha acontecido. Nessa manhã liguei à minha mãe e não parei de chorar.
(…)"
No dia 15 de setembro, a RTP vai homenagear todos estes profissionais que salvam vidas e ajudam o próximo, juntando a TV, a Rádio e o Online do grupo RTP ao longo do dia numa grande emissão que não vai querer perder – na RTP1.
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