Quase de regresso e a caminho dos 5 anos, o Bairro Alto apresenta-se como um espaço de conversa com figuras que têm algo para dizer sobre si e sobre o que fazem. José Fialho Gouveia entrevista artistas, ensaístas, cientistas, gente da moda e do espetáculo, gente do pensamento e da ação, portugueses e estrangeiros. O tom é próximo, informal, e as perguntas pedem mais que as habituais respostas politicamente corretas.
Como tem sido apresentar este programa?
JFG: Faço um balanço extremamente positivo, tanto a nível pessoal como profissional. Principalmente no início foi um desafio enorme. Tinha feito todo o meu percurso na imprensa e a televisão era, para mim, um meio completamente novo. Mas foi aliciante sair da zona de conforto – como está na moda dizer – e voltar a sentir o bichinho da novidade, o nervoso miudinho da primeira vez. Tenho crescido muito como jornalista. A nível pessoal, o "Bairro Alto" tem-me dado a possibilidade de conhecer muitas pessoas e de criar amizade com muitas delas.
O que representa para si este projeto?
JFG: Representa, principalmente, a possibilidade de conhecer e trazer ao palco televisivo pessoas com mérito e com histórias para contar. Infelizmente hoje não há muitos espaços de divulgação cultural e esse é o objectivo primeiro do "Bairro Alto".
Como é que se prepara para as entrevistas?
JFG: Fazendo muito trabalho de casa, com recurso a várias fontes. Se vamos, por exemplo, ter em estúdio um escritor que vem apresentar um livro novo, é obrigatório ler esse livro. Na recolha de material de preparação tenho a ajuda preciosa do Frederico Wiborg, o produtor do programa, e depois, sempre que possível, procuro ter um primeiro encontro com os convidados, o que é fundamental para ficar a conhecer melhor a sua história de vida e as suas visões sobre determinados assuntos.
Quem é que escolhe os convidados?
JFG: Sou eu. Até hoje nunca um convidado me foi imposto.
Em algum momento, ao longo destes anos, sentiu receio de entrevistar um convidado?
JFG: De nenhum e de todos. De nenhum porque julgo que não há razão para ter medo ou receio de um entrevistado. Ainda que as entrevistas políticas possam ter características diferentes – e as do Bairro Alto não o são – acho que uma entrevista não deve ser um confronto. E de todos porque o grau de responsabilidade é sempre o mesmo. Há sempre vontade de que tudo corra bem, ou "receio" de que alguma coisa possa correr mal. Nesse aspeto, o Norman Manea – escritor romeno com uma história de vida arrepiante e muitas vezes falado como possível candidato ao Nobel – não é diferente da Luísa Sobral – que quando foi entrevistada no Bairro Alto ainda não tinha sequer editora para o primeiro disco. Ambos merecem o mesmo respeito, ou o mesmo "receio".
Há algum ‘convidado impossível’ que gostasse muito de ter no programa?
JFG: Bernardo Sassetti. Esteve na minha lista de nomes desde o início do programa e, muito me arrependo, fui sempre adiando o convite.
Qual foi o convidado que mais o surpreendeu até hoje e porquê?
JFG: O mais surpreendente talvez tenha sido o norte-americano Saul Williams – mestre de spoken word, ator, performer e músico. Pela rapidez de raciocínio, pela energia e pela forma torrencial como comunicava e debitava ideias. Foi diferente de todos os outros. Por outra razão, também fui surpreendido pela Adriana Calcanhotto. Em regra, todos os entrevistados sul-americanos são calorosos e muito emotivos. Ela manteve ao longo de toda a conversa uma postura quase ‘nórdica’ e muito cerebral.
Todos os convidados que passam pelo Bairro Alto deixam uma mensagem especial.
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Qual foi para si o momento mais marcante do Bairro Alto?
JFG: Um dos momentos mais marcantes do Bairro Alto aconteceu na Avenida de Roma. Um toxicodependente, em visível estado de desleixo pessoal, pediu-me dinheiro. Dei-lhe uma moeda. Ele agradeceu e acrescentou: “Força Fialho, continua, gosto muito do teu programa”. Às vezes levamos destes murros no estômago.
Um dia, quando o Bairro Alto terminar, que outro tipo de projetos gostaria de abraçar?
JFG: Já dizia o John Lennon que a vida é aquilo que acontece enquanto vamos fazendo planos… Tenho muitas ideias na cabeça e quase todas passam pela escrita ou pelo jornalismo. Posso é acrescentar que gostaria muito que as televisões abraçassem novos formatos de divulgação cultural. Gostava muito, por exemplo, de ver jogos da primeira divisão da música portuguesa, mas só os das distritais é que têm sido transmitidos. Honrosa exceção seja feita ao “Palcos” da RTP2.