SARA teve a sua estreia antecipada no festival IndieLisboa onde, pela primeira vez, se exibiu uma série para televisão. SARA marca também a estreia de Marco Martins na ficção televisiva. A partir de uma ideia original de Bruno Nogueira, o realizador constrói uma sátira ao meio audiovisual português e, em particular, ao mundo da televisão
Sara é uma actriz de quarenta e dois anos que começa a questionar as suas escolhas profissionais e a sua carreira. Adorada pelos realizadores e encenadores com quem trabalha, é conhecida pela profundidade trágica que consegue imprimir em todas as personagens que interpreta. De resto, é sempre para isso que a convidam, personagens trágicas.
Sozinha e com um pai doente, decide então deixar o cinema de autor e o teatro dos grandes textos, áreas onde se notabilizou. Cansada de chorar, abandona a rodagem do seu último filme e refugia-se em casa sem saber o que fazer. Numa busca pelos tempos que correm, Sara começa então a experimentar o mundo das telenovelas, das redes sociais, das sessões fotográficas para revistas cor-de-rosa e passa a frequentar com regularidade um motivador pessoal, uma espécie de life coach de emoções, numa busca por algo diferente que a faça sentir-se mais próxima do grande público.
O feliz encontro entre o humor do Bruno Nogueira e o voyeurismo do Marco Martins contam esta história de forma desconcertante, sem dó nem piedade, a história de uma realidade bafienta que abruptamente se transforma por entre mortos e feridos. Ao longo de oito episódios, acompanhamos a tentativa de adaptação de Sara a um estilo de vida de fama rápida e de promiscuidade, as suas frustrações, dúvidas e o drama de uma actriz de cinema cansada de pensar demais. E de chorar.
SARA é a estreia do realizador Marco Martins em ficção para televisão e a primeira vez em que, tal como a actriz Beatriz Batarda, se envolve num projecto de humor, ainda que se trate de um humor marcadamente trágico-cómico. Para a realização desta série, Marco Martins reuniu as suas equipas técnica e artística habituais para um desafio diferente do que tem vindo a fazer até aqui.
«Depois do “São Jorge” talvez estivesse com vontade de fazer um projeto com características diferentes de tudo aquilo que eu tinha feito até aqui, um processo que fosse, de certa forma, mais colaborativo. Foram quatro anos muito intensos a viver sobre os escombros da crise, até estrear o filme em Veneza. Por outro lado, havia, durante um certo tempo, com a entrada do Nuno Artur Silva na RTP, um desejo de mudar a forma e sobretudo aquilo que se faz em televisão em Portugal e isso, de certa maneira, cativou-me. A última razão, e talvez a mais importante, foi a possibilidade de trabalhar com um grupo de atores que admiro, em especial com a Beatriz Batarda num registo muito pouco usual para ela e para mim, o humor. De facto, nem eu nem ela alguma vez tínhamos experimentado trabalhar num tom tão satírico, nunca tinha trabalhado material humorístico desta natureza, mas havia um lado meta discursivo, na primeira sinopse que o Bruno me mostrou, que me agradava muito numa altura em que se vivia um momento delicado para o nosso meio audiovisual.» Marco Martins
A ideia original deste projecto parte de Bruno Nogueira que, para além de integrar a equipa de escrita, interpreta o papel do life coach que Sara começa a visitar. A actriz encontra tranquilidade nos discursos absurdos deste guru que, gradualmente, se vai revelando um embuste. Vamos assim percebendo que as suas teorias místicas e espirituais não passam de uma farsa montada para esconder uma vida banal, igualmente atribulada por um relacionamento tóxico.
«A ideia surgiu-me da vontade de descobrir um pouco mais sobre o contraste entre o universo do cinema e o universo da televisão e do que essa mudança de um registo para o outro provoca num ator e, acima de tudo, na vida dessa pessoa que é o ator. Interessava-me ver uma personagem que fosse sempre associada a filmes mais densos e que é constantemente convidada para personagens trágicas em cinema, e imaginar como seria se um dia se cansasse de chorar na vida e na profissão. E ver o que aconteceria se decidisse aventurar-se no mundo das novelas, das redes sociais e de outras coisas (julga ela) mais leves e instantâneas. Isto de colocar personagens em zonas de desconforto é algo que me agrada enquanto espetador e enquanto argumentista. Provoca em quem vê, uma sensação de quase vergonha que me agrada muito.» Bruno Nogueira
Beatriz Batarda é Sara, a protagonista que dá o nome a esta série. Sara é uma actriz de cinema e de teatro conceituada. Adorada pelos realizadores, consegue sempre dar uma profundidade trágica a todas as personagens que interpreta. No entanto, a meio de umas filmagens, percebe que não consegue mais chorar e abandona a rodagem. Ao longo dos oito episódios desta série acompanhamos uma nova fase da vida de Sara, em que tenta mudar drasticamente a sua carreira e o seu estilo de vida, em busca de uma existência mais “leve”.
«Todas as personagens que interpretamos transportam a nossa biografia, dificilmente o actor consegue esconder no corpo as suas memórias e história. Talvez por isso não me veja atrapalhada em trazer um universo mais biográfico para a ficção. No caso da Sara, a coincidência começa com o apelido, seguido da partilha da mesma profissão, trazendo com esta última as respectivas ansiedades, inquietudes e situações estereotipadas. Lembro-me de passar por muitos dilemas semelhantes aos de Sara, num tempo em que toda a minha energia girava em redor da representação, coisas como a relação com o dinheiro, a relação com a imagem, ou ainda com a construção de uma identidade artística. Mas o percurso de uma actriz no cinema português sofre variações com o avançar da idade – a escrita parece tender a enamorar-se de jovens heroínas – e chegando aos trintas, os papéis femininos passam a ser de apoio, ganchos para a narração da história.» Beatriz Batarda