Uma reflexão oportuna sobre o poder, a finança e a exclusão. Clássico de Shakespeare, com encenação de Ricardo Pais, tradução de Daniel Jonas, e a representação de Albano Jerónimo.
António, um rico mercador de Veneza momentaneamente com falta de dinheiro, quer ajudar Bassânio a conquistar Pórcia e para isso pede um empréstimo a Shylock, a quem tinha tratado mal por ser judeu. O agiota acede, mas exige como garantia do empréstimo meio quilo da própria carne do mercador, a mais próxima do coração. O mercador aceita, confiando que a garantia não será necessária.
A peça de William Shakespeare (1564-1616) O Mercador de Veneza, foi representada pela primeira vez em 1605 e entrecruza duas intrigas: a que decorre na Veneza sombria e mercantil, e a que tem por cenário a beleza de portas abertas à música e ao amor de uma Belmonte supostamente virtuosa.
Uma dupla narrativa que evoca a multiplicidade humana, partindo das personagens de um judeu cruel, porém humano, e dos cristãos que fazem dele a sua vítima. Uma reflexão oportuna sobre o poder, a finança e a exclusão, o “Mercador” labora sobre a ambivalência e a consanguinidade irresolvida e conflitual entre judeu e cristão.
Tomando em mãos uma obra que baralha as coordenadas da alteridade nacional, rácica, religiosa e sexual, Ricardo Pais transcreve para a cena a força sanguínea tanto da prosa como da poesia do judeu Shylock, do cristão António, de Pórcia, Bassânio e restantes personagens, e aciona o jogo de duplicidades a que Shakespeare as abandona.
Na Veneza de escuros becos psíquicos imaginada por Shakespeare, com uma muito musical Belmonte do outro lado do espelho, o chamamento vem do seu interior: “Vamos sentar aqui, deixar que os sons da música nos subam aos ouvidos”.