A maior força do EI é precisamente o seu carismático líder. E isso poderá ser igualmente a sua maior fraqueza. Eliminando o chefe, será pouco provável a sobrevivência em bloco do grupo radical.
A ascensão de Abu Bakr à liderança do Estado Islâmico do Iraque e do Levante (EIIL) e ao correspondente prestígio na Al Qaeda, antes da sua queda em desgraça junto do líder Ayman al-Zawahiri, permite depreender que o líder do EI é um homem militarmente ousado, com carisma e extremamente ambicioso. Tem-se ainda revelado um bom administrador dos recursos conquistados.
Auto denominado califa do Estado Islâmico sob o nome Ibrahim (o seu nome de nascimento), Abu Bakr Al Bagdadi não é só o novo inimigo número 1 do mundo Ocidental. As lideranças de países da região, sejam sunitas, como a Arábia Saudita, xiitas como o Irão, ou militares como o Egipto, também colocaram a sua cabeça a prémio.
No terreno, curdos e iraquianos xiitas encabeçam a resistência ao EI. Têm já o apoio de múltiplas potências, com os Estados Unidos à cabeça. Bombardeamentos aéreos norte-americanos foram cruciais para a recuperação do controlo de pontos estratégicos como a barragem de Mossul, no Iraque.
Uma coligação de 40 países e organizações está ainda a fornecer armas e equipamentos para auxiliar o esforço de guerra. E as principais forças islâmicas sunitas atacam a ideologia do grupo com a força da pregação.
Com a sua crueldade e violência o EI comprou uma guerra em múltiplas frentes.
A eficácia dos bombardeamentos aéreos deverá diminuir à medida que os militantes se adaptam, escondendo alvos e misturando-se com as populações civis. A estratégia norte-americana de não envolvimento para além de apoio as tropas locais através de Bagdade e de Erbil, terá por isso de se adaptar também a médio prazo. A Casa Branca já admitiu aliás que poderá autorizar “caso a caso” a presença de tropas americanas em terreno iraquiano, sobretudo para guiar os ataques aéreos.
Para o Estado Islâmico o apoio das populações sunitas, dentro e fora dos territórios conquistados, é crucial para este primeiro período de domínio. O grupo é ele próprio sunita, de raiz salafita, e segue uma interpretação radical extremista. O seu domínio apoia-se no terror, por um lado, e no provimento de apoios sociais por outro, algo que, em tempo de guerra, deverá ser escasso e frágil.
A tática da crueldade e da força poderá ainda criar ressentimentos entre as comunidades locais submetidas e um Governo de unidade iraquiano que inclua sunitas tanto como xiitas e curdos, pode dar força aos inimigos do EI dentro dos território que este controla no Iraque.
A resistência sunita faz-se aliás sentir de forma particular na província iraquiana de al-Anbar, que o grupo tenta dominar desde janeiro de 2014, tendo assumido logo nesse mês o domínio das cidade de Ramadi e de Faluja. A partir de agosto O EI procurou destruir em especial a tribo de Albu Nimr, da região de Hit e uma das suas mais ferozes opositoras.
Na Síria, a coligação internacional está a considerar armar e equipar os grupos seculares que se oponham tanto ao Governo de Bashar al-Assad em Damasco, como aos radicais do Estado Islâmico. Um exército Síria Livre apoiado pela força dos EUA poderá revelar-se um inimigo demasiado poderoso.
Os curdos sírios têm-se igualmente revelado um inimigo duro de roer, sobretudo pela sua defesa da cidade de Kobani, no norte do país e junto à fronteira turca.
Os grupos radicais são outra força que poderá drenar homens e recursos do EI e que este terá de tentar controlar ou vencer rapidamente. Nesta frente destaca-se a Al Qaeda, até agora o maior perigo terrorista a nível mundial.
O Estado Islâmico formou-se em parte à sombra da al Qaeda, sob o nome Estado Islâmico do Iraque (EII ou ISI na sua designação em inglês) mas o líder da Al Qaeda, al-Zawahiri, repudiou-o quando entrou em choque com as ambições de al-Bagdhadi.
O líder da al Qaeda, Ayman Al-Zawahiri comanda a força de centenas de grupos terroristas e poderá lança-las contra o novo ‘califa’. O facto de o Estado Islâmico ter derrotado vários grupos rivais pelo domínio na Síria poderá ainda ter criado ressentimentos e inimigos formidáveis. Mas poderá também atrair antigos oponentes pela sua força, prestígio e poder.
Outro fator a ter em contra por al-Bagdadi é a proximidade do Irão, a potência xiita local, pouco interessada em ter às suas portas um Califado sunita com pretensões expansionistas. Em caso de derrota de uma eventual coligação de interesses sunitas e curdos apoiados pelo Ocidente, Teerão poderá avançar com todos os seus recursos e armamento, ainda consideráveis apesar de anos de sanções internacionais, para apoiar a maioria da população iraquiana, que é xiita.
A Turquia é outra potência, membro da NATO, que poderá drenar recursos militares ao EI e, sobretudo, cortar linhas de abastecimento forçando o líder do EI a procurar alternativas, eventualmente no Afeganistão.
Em Outubro, a Turquia e os estados Unidos aliaram-se para destruir as redes de contrabando, sobretudo de petróleo, que o EI usa para escoar os produtos das regiões que domina e auto-financiar-se.
Estar só contra o mundo inteiro pode servir um “ideal apocalíptico”, como lhe chamou o atual Chefe de Estado Maior das Forças Armadas dos EUA, mas é uma receita quase infalível para a derrota. Para sobreviver, o EI terá de ceder e vergar ou de formar alianças rapidamente.
Por Graça Andrade Ramos