Após ouvir mais de 100 relatos de vítimas e de testemunhas, o Alto Comissariado da ONU para os Direitos Humanos afirmou esta quinta-feira que os membros do grupo islamita Estado Islâmico podem ter cometido um genocídio contra a minoria yazidi, do Iraque.

No seu relatório, o organismo sublinha que os combatentes podem ainda ser acusados de crimes contra a humanidade e de crimes de guerra contra civis, incluindo crianças.

O documento detalha as ações do EI desde junho de 2014, altura em que lançou a sua ofensiva contra o norte iraquiano. Assassínios, torturas, violações e escravização sexual, e recrutamento de crianças “contra numerosos grupos étnicos e religiosos no Iraque, dos quais certos podem constituir um genocídio”, afirma o ACDH em comunicado.

O organismo apela ao Conselho de Segurança da ONU para referir o caso ao Tribunal Penal Internacional, de forma a prosseguir com o processo de acusação.

“O esquema manifesto dos ataques contra os yazidis é indicativo da intenção do EIIL (Estado Islâmico do Iraque e do Levante, outro nome do EI) de destruir os yazidis enquanto grupo” diz o relatório. O que, afirmam os investigadores, “sugere fortemente que o EIIL poderia ter perpetrado um genocídio”.

Também as forças governamentais iraquianas e milícias afiliadas “podem ter cometido alguns crimes de guerra” ao combater a rebelião, acrescenta o relatório.

Yazidis e não só

A comunidade yazidi iraquiana, vista como apóstata pelos islamitas, foi perseguida pelo grupo Estado Islâmico durante a ofensiva deste para conquistar o norte iraquiano, no verão passado.

Em Agosto, estiveram durante semanas isolados e sob ataque nas montanhas de Sinjar, tendo sido libertados após a intervenção conjunta da Coligação internacional contra o EI, recém-formada e por combatentes curdos e pelo exército iraquiano.

Milhares deles habitam agora em tendas nos campos de refugiados da ACNUR.

Além dos yazidis, o Estado Islâmico persegue as comunidades islâmicas xiitas (incluindo as alauítas, na Síria) e as sunitas que não lhes juram fidelidade.

  • crianças xiitas lutam por auxilio humanitário após 2 meses de cerco em Amerli a 1 de setembro de 2014 (foto reuters)
  • Mulher e criança yazidi no campo de Nowruz em agosto de 2014 (foto Reuters)

Os cristãos são igualmente mortos ou expulsos das suas comunidades e as suas igrejas destruídas e pilhadas.

Na Síria, as aldeias cristãs assírias foram esvaziadas em março sob o assalto das forças jihaddistas, no mais recente episódio de perseguição. Várias centenas de pessoas foram raptadas e são mantidas reféns. Poderão ser fonte de financiamento para o EI, via resgates, ou ser vendidos como escravos.

“Tratamento brutal”

Todas as ações referidas no relatório do Alto Comissariado para os Direitos Humanos podem constituir violações do direito internacional, dos direitos do Homem e do direito humanitário, de acordo com os investigadores.

Estes denunciam o “tratamento brutal” infligido a outros grupos étnicos, entre eles cristãos, turcomenos, sabeístas (um grupo judaico-cristão pouco conhecido), mandeísta (religião pré-cristã gnóstica com alguns milhares de membros), curdos e xiitas, entre outras.

Quanto às forças iraquianas, os autores do relatório referem informações sobre violações graves dos direitos do Homem, durante as operações de contra-ofensiva contra o EI, as quais poderão ser consideradas igualmente crimes de guerra.

Familias iraquianas rendem-se a tropas iraquianas em Jour al.Sakhr a sul de Bagdade (Mahmoud Raouf Mahmoud  Reuters) 27 out 2014

As forças iraquianas e as milícias de voluntários xiitas, apoiados pelo Irão, têm sido acusadas de violência por civis sunitas da província de al Anbar e do norte de Bagdade. Afirmam que os soldados e as milícias expulsam violentamente as pessoas das suas casas, acusando-as de colaborar com o EI, entre outros crimes como violações, tortura e pilhagens.