Oub'lá

The Parkinsons

Foto: Luís Sousa

“A banda já faz parte do nosso ADN”

 

Os conimbricenses The Parkinsons regressam a Lisboa em dose dupla para concertos no Sabotage, no Cais do Sodré. A banda de Victor Torpedo, Pedro Chau e Afonso Pinto – hoje com Paula Nozzari na bateria – está de volta a um palco a que chamam de “casa” para celebrar o lançamento, em vinil, do disco-bomba que editaram em 2002 em Londres: “A Long Way To Nowhere”.

Foi em 2000 que os três amigos de Coimbra rumaram até à capital inglesa com intenção de formar uma banda, trabalhar e ganhar dinheiro para tentar mudar a sorte e irem ter sucesso nos EUA. Mas o sucesso trocou-lhes as voltas: o disco de estreia, em 2002, tornou-os numa das bandas-sensação da cidade. Numa altura em que era o britpop de Blur, Oasis ou The Verve a reinar em terras de Sua Majestade, foi o trio de Coimbra (na altura com Chris Low na bateria) a recordar os “brits” o que era o punk.

Foram três anos de concertos, muitos deles interrompidos – velozes, suados, molhados, por vezes sangrentos e violentos – digressões por todo o mundo (EUA, sim, mas para tocar em duas noites numa passagem de ano; e também Japão, na maior digressão até então de uma banda ocidental). Da mesma forma que o fósforo se acendeu, também se apagou. Ficam as memórias de Victor, Pedro e Afonso, que se reúnem esporadicamente para recordar os momentos e fazer a festa, mas fica também a recordação desses momentos através do documentário com o nome do primeiro disco realizado por Caroline Richards.

Victor Torpedo recorda-nos como foi esse período da vida dos The Parkinsons. E diz-nos também porque é que não devemos faltar aos concertos de amanhã e sexta-feira.

Conta-nos o que é que se vai passar nas próximas duas noites no Sabotage.

Ir ao Sabotage é uma espécie de regresso a casa. É uma casa onde já nos sentimos tão confortáveis que acaba por ser sempre uma celebração. A primeira vez correu tão bem que agora temos de voltar com regularidade para fazer uma festa especial. E desta vez talvez seja ainda mais um bocado especial, porque vamos tocar músicas que não tocamos há mesmo muitos anos. Há talvez uma ou duas que não tocamos desde os primórdios da banda, de quando estávamos em Londres. E há uma música que nunca tocámos mesmo – talvez só nos primeiros concertos em Inglaterra.

Todos os anos gostam de voltar ao Sabotage. Mas é sempre diferente?

Sempre diferente, por isso é que voltamos! Eu falo por mim: gosto daquele ambiente claustrofóbico e acho que há poucas salas onde se pode fazer concertos assim. Ou são salas muito grandes ou então não têm muito que ver connosco. Eu gosto de sentir a claustrofobia, o calor e a loucura por perto.

Tal como acontecia nesses tais primeiros concertos em Londres, que ficaram na história.

Exatamente. Mas nós tentamos sempre fazer isso, de qualquer forma.

 

“A primeira vez que vi o documentário [“Long Way To Nowhere”] arrepiei-me todo, porque foi ver a minha vida à frente, sem cortes. Foi um choque”

 

Ainda ensaiam para estes concertos ou preferem a espontaneidade?

Os The Parkinsons já fazem parte do nosso ADN. Principalmente do meu e do Pedro Chau – agora da Paula Nozarri que veio dar, na bateria, uma vida enorme à banda. Mas em relação aos elementos principais – eu, o Chau e o Afonso – está dentro de nós. Não é preciso muito estudo. Podemos não nos lembrar num momento, mas no segundo a seguir volta tudo.

Acabaram de reeditar o primeiro disco, Long Way To Nowhere. Como é para tocar as canções desse primeiro disco? Uma banda punk também sente saudades?

Eu, normalmente, gosto é de andar para a frente. Mas, se pensar bem, tocar essas músicas nem é andar para trás, porque não tocamos há tanto tempo que soam quase a músicas novas. Como temos tocado mais canções do último disco que fizemos, estar a tocar estas músicas antigas, as do primeiro disco e as dos primeiros tempos em Londres, é como se fossem as novas. Fazem-nos voltar a sentir a energia que já estava acabada. É quase um renascer, um fenómeno quase alado. O filme [documentário de Caroline Richards] ainda nos veio dar mais energia.

Em que sentido?

O filme tem sido exibido em vários sítios. E nas primeiras vezes doía vê-lo. Agora já o vimos algumas vezes, já começa a entrar mais no sistema.

Porque é que doía?

A primeira vez que vi o documentário arrepiei-me todo, porque foi ver a minha vida à frente, sem cortes. Foi um choque. Não imaginava, sequer, a quantidade de imagens que havia nossas. Nesse aspeto somos uma banda abençoada: temos imagens nossas desde o segundo concerto, numa altura em que não havia os telemóveis. Realmente somos uma raridade.

“A explosão dos The Parkinsons aconteceu em dois concertos! É incrível! A derrocada também acontece em pouco tempo (risos), mas acho que não conheço nenhuma banda na história que conseguido tamanha exposição em tão pouco tempo”

 

Em 2002, quando partiram para Londres, levavam alguma expetativa? Acredito que pudessem ter o sonho de fazer algo ligado à música, mas pensavam que poderiam vir a ter todo aquele impacto?

Claro que nunca pensei que pudesse dar no que deu. Era impossível prever que a coisa rebentasse logo assim tão rapidamente: a explosão dos The Parkinsons aconteceu em dois concertos! É incrível! A derrocada também acontece em pouco tempo (risos), mas acho que não conheço nenhuma banda na história que conseguido tamanha exposição. Ao fim de dois concertos já não conseguíamos ensaiar mais, já andávamos em tournée, a tocar no festival de Reading, em Glastonbury, nos festivais todos – foi esse “o filme do business”.  Custou a arrancar, mas foi: não tínhamos dinheiro, não tínhamos maquetes, então o que fazíamos era dizer às pessoas que éramos mesmo muito bons e fazíamos altos concertos, porque éramos expulsos dos sítios todos (risos)! A nossa ideia, ao ir para Londres, era fazer a banda, ganhar dinheiro, arranjar uns trabalhos e ir para os EUA, que era onde eu tinha os contactos e ainda estava cheio de energia.

Mas também chegaram a ir ao EUA. Só que já não ficaram.

Foi logo no primeiro ano! Em 2001. Mas foi já numa onda de quase estrelato. Fomos lá num fim de ano, duas datas, para partir um bar! Tocámos com os Liars, que fizeram a primeira parte. Só que aquilo estava tão grande em Inglaterra era uma burrice sair de lá.

Porque é que achas que da mesma forma que começou, tão repentina, também acabou?

Nós ainda fizemos mais. Tivemos o EP Streets of London e depois mais um disco, o Reason To Resist [2014]. Depois houve ainda o Reason to Resist [2005], comigo a cantar, porque era para ser com o Afonso, mas foi na altura em que ele saiu. Dava para muito mais! Mas foi muita desgraceira pelo meio. Eu continuo a pensar que tu chegas onde queres chegar. Mesmo hoje em dia, para mim, não há limites, só que sou eu que tenho de tomar as minhas opções! Se eu decidir que quero ser médico daqui a cinco anos, acredita que eu consigo. Eu sou esse tipo de pessoa. E na música é a mesma coisa: é uma questão de compromisso. As bandas que explodem realmente são as mais jovens, ao primeiro disco – e vês isso com bandas inglesas, como os Arctic Monkeys ou os Horrors e muitos outros. Não há limitação no emprego, não têm família, não têm filhos… Eu continuo com essa dedicação. Sou muito honesto e leal a uma veia musical.

 

“Sou muito honesto e leal a uma veia musical”

 

Para lá dos The Parkinsons o que é que estás a fazer?

Tenho a minha cena a solo, que é o Victor Torpedo Karaoke Show. Também toco com os Subway Riders, que é uma banda mais antiga de Coimbra – tocamos desde 1989. Também os Psicotronics, de Portalegre, que é um projeto do Marquis de Cha Cha. Também tenho participado com os A Jigsaw. E por aí fora.

Sentes que a tua história e a dos The Parkinsons também tiveram um papel importante na cena cultural de Coimbra?

Sim e estamos a voltar a ter outra vez. Não é tanto os The Parkinsons, mas as personas que fazem parte. A nossa saída de Coimbra, que éramos uma espécie de pivots, foi grave. A do [Paulo] Furtado, para Lisboa, também já tinha sido grave. Depois a minha, do Pedro Chau e do Afonso, criou uma série de órfãos da cidade. Ficou cá o Kaló com os Bunnyranch, que também é da Velha Guarda, mas deixámos muita gente em baixo e tivemos de ser nós a voltar a dar o kick na cidade. E temos dado. Estão outra vez a surgir bandas.

O que é que podemos ouvir de novo vindo de Coimbra?

Os Pussylips, que são uma banda fantástica. Também há os The Walks. Os Ghost Hunt também acabaram agora de lançar um disco. E há também o ressurgimento do Kaló, agora os The Twist Connection. De certa forma, nós estando cá também foi um kick para ele voltar, depois de uma série de anos de interregno. Mas é bom é estarmos cá para nos chatearmos uns aos outros e dizermos: “És tão bom que tens é de ir para o palco!”

Entrevista: Bruno Martins