Oub'lá

Branko

 

“Este segundo momento da Enchufada também é super emocionante, porque é uma maturação com os olhos postos na rua”

 

Foi em setembro de 2015 que João Barbosa, aka Branko, editou o seu último disco de originais. O lançamento de Atlas coincidiu, mais ou menos, com anúncio do fim dos Buraka Som Sistema, depois de dez anos a evangelizar a ideia de uma música de dança global. Dois anos depois, os Buraka Som Sistema estão adormecidos. A vida de Branko ganhou mais um par de horas por dia que acabou por dedicar às paredes que eram uma espécie de abrigo editorial para o coletivo que tinha com Conductor, Kalaf, Riot e Blaya: a Enchufada. Branko prefere chamar-lhe um “guarda-sol gigante” que hoje abriga uma renovada geração. Hoje João Barbosa assume uma espécie de papel de diretor criativo, A&R, conselheiro de novos talentos como o caso de Dotorado Pro, Kking Kong e Rastronaut. São eles a espinha e os músculos, em Portugal, da Enchufada nos dias de hoje. Mas a ideia da globalidade continua a fazer parte do ADN da Enchufada e não sai da cabeça de Branko nem por um instante. O radar de João Barbosa continua ligado e em permanente comunicação múltiplas latitudes: do Brasil ao Gana; da África do Sul à Coreia do Sul com óbvias paragens em pólos mais centrais como Londres, Los Angeles, Berlim ou Amesterdão.

A zona da Enchufada, na ideia de Branko, é tudo isto que nos rodeia. Algo que se comprova com a última compilação da label com a curadoria do próprio João Barbosa. É ele que põe este planeta sediado em Campo de Ourique, Lisboa, a girar e que distribui o jogo.

Em vésperas de uma importante celebração de todo este movimento — sexta-feira, dia 6 de outubro, no Mercado Time Out, em Lisboa (com Mina, Dotorado Pro, Rastronaut,  Kking Kong e o próprio Branko) — João Barbosa espreita o retrovisor dos últimos dois anos; a forma como mudaram os seus dias, a ideia do trabalho de escritório junto de uma nova geração sem nunca perder o foco da criação, apontando já para um novo trabalho de originais para 2018.

 

Dois anos depois de teres editado o teu último disco a solo; um ano depois depois do fim dos Buraka Som Sistema, a festa Enchufada na Zona, no Mercado Time Out, em Lisboa, serve para fechar ciclos ou apresentar um novo?

Eu diria que, depois dos últimos dois anos — desde o Atlas em Setembro; do Globaile em julho do ano passado… — diria que esta ideia do Enchufada na Zona é mais o abrir de um ciclo e não o fechar de nada. É uma ideia que acaba por tentar sintetizar aquilo que a editora se tornou. Era uma editora cujo 80 por cento do trabalho era centrado e focado à volta dos Buraka Som Sistema e que ficou com algum tempo livre. A Enchufada, a partir daí, começou a poder inventar muitas outras coisas, a continuar o trabalho de outra forma, a ter que se reinventar e a ser obrigada a ter uma perspetiva diferente. Vieram mais edições, mais artistas novos que ganharam uma dimensão caseira — juntámos um núcleo duro que sou eu, o Rastronaut, o Dotorado, Kking Kong… são as pessoas que estão sempre. A festa vai mostrar a ideia da Enchufada renovada, que é o que está a acontecer agora.

 

E como é que vês esse abrir de um novo ciclo? De que forma é que isso vai ter reflexo nesta festa do Cais do Sodré?

Mesmo sendo a Enchufada com algum tempo, com dez anos de atividade, nesta festa vai ser quase tudo novo. Mesmo o que vou tocar… tudo isto está já numa nova fase de existência, tanto de música, como até na geração que vai assistir aos espetáculos. Acho que tudo isto é hoje consumido de uma forma diferente da que se consumia há dez anos e com uma naturalidade brutal.

 

“São pessoas de cá, que têm música nova, diferente, original e não pessoas de Portugal que estão a fazer o mesmo techno que se faz em Berlim nem o mesmo house que se se faz em Chicago e arredores”

 

Então o público da Enchufada também se renovou?

Acho que sim. Sinto que é um segundo momento da Enchufada e este segundo momento também tem um novo público. Da mesma forma que era emocionante com os Buraka, há dez anos, este momento também o está a ser porque é uma maturação com os olhos postos na rua, a procurar desvios e a tentar outros caminhos para o dia a dia social e real na cidade de Lisboa. Isso está aplicado de forma perfeita nestas quatro pessoas que estão a representar o contingente Enchufada: o DotoradoPro que vem do lado de lá do rio [Tejo], nascido e criado até determinada altura em Angola e que depois vem para cá (nos Buraka tinhas o Kalaf que era essa pessoa, ou o Andro). E depois o contingente meio Amadora-Benfica, em que cada um dá mais para o techno, outro que é um geek mais enfiado no estúdio a descobrir os últimos detalhes. E estou eu, se calhar eu: uma cola disto tudo (como já sou há algum tempo) que acabo por tentar ter essa objetividade das coisas de fora. São pessoas de cá, que têm música nova, diferente, original e não pessoas de Portugal que estão a fazer o mesmo techno que se faz em Berlim nem o mesmo house que se se faz em Chicago e arredores.

 

Isso é daquelas coisas bonitas do som do presente de Lisboa: reflete o que se faz aqui e agora, sem recorrer a grandes importações.

Claro, o que se faz aqui no presente e a pensar o que se vai fazer no futuro. Eu estou numa fase da minha em que não valorizo quase mais nada. Eu não perco mais de 20 segundos a ouvir uma coisa que foi feita com outro pressuposto. Por exemplo: há umas semanas estivemos no Festival Iminente, em que se celebra toda essa construção… é um momento bonito, está a acontecer aqui e agora e tem que ser abraçado ao máximo possível. Este é o momento em que se criam novas direções musicais com base naquilo que é a realidade das nossas ruas.

 

O teu papel na Enchufada, nesta altura, como dizias…

… sou o gluten!

 

Mais a cola, não é? Como é que a tua vida mudou no último ano?

Tal como a Enchufada teve mais tempo para se reinventar e chegar a novas conclusões com o fim dos Buraka Som Sistema, eu também acabei por ter. Fiquei com algumas horas livres no meu calendário que acabei por tentar preencher de forma relativamente útil. Uma dessas formas foi reavivar esta estrutura e começar a puxar para uma direção concreta.

 

“Fiquei com algumas horas livres no meu calendário que acabei por tentar preencher de forma útil. Uma dessas formas foi reavivar esta estrutura e começar a puxar para uma direção concreta. Ser criativo de forma artística em termos de música enquanto Branko”

 

Ser criativo de outra forma?

Sim, em termos de label, mas também ser criativo em termos de música enquanto Branko. Enquanto label, acabam por se misturar as coisas. O resultado dessa mistura está, por exemplo, na compilação Enchufada na Zona.

 

Que compilação é essa?

A minha ideia era ter um EP mais club — já que o disco [Atlas] tinha sido mais apontado para canções. Lembro-me de me sentar em frente ao computador e não saber muito bem o que fazer até que pensei que aquilo que faço nos meus sets é tocar as músicas das pessoas que estão à minha volta, com alguns edits. Então por que não agarrar nisso tudo, naquele set de Branko de uma hora, e transformá-lo numa compilação? Essa compilação acabou por ser a Enchufada na Zona.

 

“Continua a não haver uma residência semanal que nos permita ouvir esta música – o que é um bocado estranho, não haver a “Disneyland do Afro-House” em Lisboa. Mas há pistas e tudo mais para se conseguir fazer isso, e a Enchufada acho que é um desses pólos de celebração onde esse momento está a acontecer”

 

É uma compilação que também reflete a visão de futuro que tens para a Enchufada?

A Enchufada está a passar por uma fase de auto-sustento: existem diversas fórmulas musicais que podem ser postas em prática para o público de Lisboa e do Mundo. E esse momento está a acontecer agora, com calma. Agora não estamos tão a vender a cidade nem tão a vender só a música: estamos exatamente no meio. Essa ideia da cidade existe, mas também não tanto quanto isso. Por exemplo, continua a não haver uma residência semanal que nos permita ouvir esta música — o que é um bocado estranho, não haver a “Disneyland do Afro-House” em Lisboa. Mas há pistas e tudo mais para se conseguir fazer isso e nesse sentido a Enchufada é um desses pólos de celebração onde esse momento está a acontecer.

 

E isso também se reflete nas escolhas dos artistas que integram a Enchufada Na Zona.

Sim, na percentagem da música daqui, de Portugal, que ultrapassa os 50 por cento. Além disso, a compilação continua a celebrar outros sítios em que sentimos que ainda existe o mesmo tipo de energia: em Londres, claro, que faz a conexão com a Costa Oeste de África; através da Mina que participa num tema com um MC chamado Bryte, que é de Acra [Gana]; ou através do projeto Jowaa — de um produtor chamado Gafacci, também de Acra… ou os Batuk, com uma mistura de Moçambique com África do Sul; o Brasil, com a BadSista e Sansai… é continuar a ir buscar as diásporas diversas pelo mundo fora, que celebram exatamente essa mesma linguagem, que poderiam encaixar mesmo sendo uma língua diferente do português.

 

O Dotorado Pro, o Kking Kong e o Rastronaut são daqui da casa. Mas há outro nome que vem de fora: a Mina. Quem é a Mina?

A Mina é uma DJ e produtora londrina, com quem já temos uma relação há algum tempo. Ela só tinha editado uma música antes da Enchufada — e isto virou a casa oficial dela. Ela viaja muito para Acra, no Gana, onde tem feito bastantes colaborações e workshops, por isso também tem uma relação com essa música toda da Costa Oeste de África. Não faz parte do contingente lisboeta, mas faz parte do coletivo de trabalho num nível mais amplo.

 

Como chegaste até ela? A tal música que ela editou foi suficiente para a Enchufada “recrutá-la”?

Foi uma junção de coisas. Eu cheguei até ela através de um programa que ela estava a fazer na rádio londrina RADAR, tinha um programa chamado Boko! Boko!. Eu consigo ter uma noção das pessoas através da seleção musical que fazem: isso iniciou uma conversa e as respostas dela foram as que eu buscava.

 

Como vai acontecer a noite no Cais do Sodré? Serão atuações à vez ou a cabine de DJ vai ser partilhada entre todos?

São atuações à vez. A ideia é mesmo foco no artista. As pessoas têm de individualizar cada pessoa enquanto entidade de criação, com as suas influências e dentro do seu género. Esse foco é individual, seja em 45 minutos ou uma hora. Quem se lixa sou eu, porque como toco música de toda a gente, depois acabo por não poder tocar nada e tenho que ir a música mais antiga (risos)! Não apetece fazer uma noite até às seis ou sete da manhã, mas antes fazer algo em que as pessoas saem frescas, que acabaram de experienciar Branko, Dotorado Pro, o Rastronaut, o Kking Kong e a Mina e perceberam quem são essas pessoas e o statement artístico, para as ficarem a conhecer. Não apetece muito estar sempre com um carimbo gigante em que tudo é Enchufada… continuamos a querer que as pessoas venham pelas personalidades individuais, pela música… a Enchufada é só um guarda-sol gigante onde cabemos todos lá debaixo para apanhar sombra e estarmos um bocadinho mais refugiados de potenciais coisas que possam vir de fora.

 

“Hoje tento tocar mais cedo, porque sinto, cada vez mais, que a música que se produz aqui é de dança, mas com bastante informação. E essa informação, a partir das cinco da manhã dificilmente vai continuar a ser consistente”

 

Achas que o teu filtro para todos estes géneros também mudou com o passar dos anos? Estás hoje mais interessado em algumas coisas e menos noutras?

Eu sinto que hoje em dia vou à procura de uma construção musical que me consiga colocar numa posição diferente. Cresci muito ao vir da escola do drum ‘n’ bass, ao ser aquele tipo de DJ que tocava músicas muito rápido — breakdown-drop, coisas de um minuto e meio cada música. E sinto que cada vez mais estou a tentar ver isso noutra perspetiva e a ter ir buscar música que me consiga fazer ter um momento de construção para pista de dança e não tanto de um grito de um início ao fim. Há muita gente que quando chega a uma determinada idade acaba por alcançar uma maturidade musical e pode virar techno — ou disco! No meu caso acabou por ser o que já estava a ser posto em prática, mas a adaptar a uma realidade mais techno.

 

Tens tido tempo para a criação de um disco novo?

Tenho, e é engraçado falar agora disso: o elemento diferencial que me permitiu ter este tipo de perspetiva para os sets é porque com o Atlas — um disco de digestão super-lenta, que ainda hoje vai sendo descoberto por muitas pessoas, com temas como “Paris Marselha”, com a Princess Nokia ou “Reserva Para Dois” com a Mayra Andrade — acabou por me possibilitar o inventar aquilo que quero. Hoje vou pautando o meu set com esses momentos e que isso acaba por ser suficiente. Preciso de continuar a ter isso e, sim, estou com os olhos em fazer música nova… vai ser o que vou ficar a fazer até ao final do ano.

 

Consegues ter tempo para isso, por entre todo este trabalho de A&R, CEO, “professor” desta malta toda da Enchufada?

No fundo é preciso saber gerir as coisas. É acordar um bocadinho mais cedo! É o que vai mudando no dia a dia… depois de ir pôr a minha filha à escola, consigo vir logo para aqui, chegar duas horas mais cedo que toda a gente porque eles só começam a chegar às 10h30, 11h… eu já estou com duas horas em que já comecei um beat!

 

Agora trabalhas menos à noite?

Nunca fui muito de trabalhar à noite, mas sim, trabalho menos à noite.

 

E agora, se calhar, também já começas a tocar ao vivo mais cedo…

Eu tento tocar mais cedo, porque sinto, cada vez mais, que a música que se produz aqui é de dança, mas com bastante informação. E essa informação, a partir das cinco da manhã dificilmente vai continuar a ser consistente. Não só do ponto de vista do DJ, mas sobretudo pode ser cansativo para o público continuar a dar informação uma noite inteira. Cada vez sinto mais que estas noites têm quase o tempo de vida de um concerto: os sets têm de ser curtos, tem que se mudar a linguagem, dar a informação toda… mas chega uma altura em que mais vale passar uma música mais genérica, em que não seja preciso reagir tanto ou ter uma relação tão direta entre o DJ e a pista. Nesse sentido tenho estado sempre a puxar para tocar mais cedo e digo: “Arranja outra pessoa para as cinco da manhã!” (risos) No máximo, quero tocar até às duas.

 

“Não apetece fazer uma noite até às seis ou sete da manhã, mas antes fazer algo em que as pessoas saem frescas, que acabaram de experienciar Branko, Dotorado Pro, o Rastronaut, o Kking Kong e a Mina e perceberam quem são essas pessoas e o seu statement artístico. Não apetece muito estar sempre com um carimbo gigante em que tudo é Enchufada…”

 

Foi algo que aprendeste, por exemplo, com as Hard Ass Sessions, na residência do Lux?

Sim, até as passaram para o bar por causa disso: interessava-nos começar a criar a noite desde o zero até ao ponto máximo e não ter que ir até às sete ou oito da manhã. Essa relação com o Lux — que é um dos mais brilhantes clubes que existe ao cimo do planeta Terra — já existe há oito anos. Aprendeu-se e cresceu-se imenso ao ponto de até de perceber que precisávamos de ir ver outras coisas… mas também atuações noutros festivais: o Amsterdam Dance Event, no ano passado; o Bons Sons, Paredes de Coura… também deram esse know how de conseguir ver quando é que as pessoas deixaram de absorver informação e estão só em piloto automático.

 

E isso é marcante também no teu momento criativo? Como é que esse apercebimento se traduz na criação de um disco?

Desde sempre que a experiência de djing, de tocar para pessoas, fez parte do momento de criação também. Desde sempre! É logo na altura em que estou no estúdio, a criar, que começo a pensar em quando é que vou poder experimentar ao vivo. Só depois de tocar duas ou três vezes é que vou agarrar e tentar encaminhar de alguma forma. Um teste é o ir a ouvir no carro, outro teste é o club. Tudo faz parte do processo criativo. No outro dia gravámos uma música com um rapper brasileiro, o Rincon Sapiência, e assim que a acabei, quis passá-la no Festival Iminente. Se ninguém parar de dançar para ir ao bar, quer dizer que está OK.

 

“Desde sempre que a experiência de djing fez parte do momento de criação. Só depois de tocar duas ou três vezes um tema é que vou tentar encaminhar de alguma forma. No outro dia gravámos uma música com o Rincon Sapiência e assim que a acabei quis tocá-la. E se ninguém parar de dançar para ir ao bar, quer dizer que está OK”

 

Este estúdio onde estamos está de cara lavada desde há uns meses. Como é que tem sido o convívio aqui entre todas estas pessoas que passam pela Enchufada?

O estúdio sempre foi um espaço aberto. Foi agora renovado; estava há imenso tempo para fazer obras e nunca tinha tido tempo para as fazer. Mas é um espaço aberto para quem faça parte do coletivo, para acabar projetos, criar ou o que quer que seja…

 

Como é que trabalham em conjunto? Qual é o teu papel junto deles, já que és o mais velho e eles são um bocadinho mais novos…

É uma partilha. Quem está aqui… é impossível não se ouvir as músicas a nascerem. Se ouves alguma coisa de jeito, entras pela sala dentro e perguntas: “o que é isso?!” E no fundo são momentos trigger [gatilho]… “Espera, se ele estava lá ao fundo a mandar emails e vem para aqui falar comigo é porque fiz alguma coisa que valeu a pena.” O Dotorado vive em Setúbal, vem aí só às vezes. Mas o Kking Kong passa mais tempo, porque vive na Damaia, e então é só apanhar um autocarro. Eu e o Rastronaut andamos sempre por aqui: somos as duas pessoas que garantem o funcionamento de escritório disto. Estamos por aqui a fazer acontecer.

 

Lidas bem com essa tarefa do trabalhar num escritório?

Nunca tive de o fazer tanto como agora e estou ainda a gerir. Lido bem, no sentido em que tenho interesse e quero estar por dentro do máximo de coisas, ter o máximo de informações possíveis, ao ponto de conseguir estar em qualquer conversa sobre a indústria musical e saber o que estou a dizer. Mas talvez a parte que ainda está mais por aprender é aquela de ir para o estúdio, passar a manhã a mandar mails e depois à tarde a criar.

 

Organizar melhor o tempo?

Sim, é o mais difícil. E às vezes acabou por ter de vir cá ao fim de semana, para poder acabar ou trabalhar melhor e sozinho uma música.

 

“Lido bem [com a vida de escritório] no sentido em que tenho interesse e quero estar por dentro do máximo de coisas, ter o máximo de informações possíveis, ao ponto de conseguir estar em qualquer conversa sobre a indústria musical e saber o que estou a dizer”

 

Gostavas de lançar disco novo em 2018?

Sim, sinto que estou com vontade de me sentar a fazer música nova. Sinto isso quando começo a agarrar todos os intervalos possíveis e imaginários para abrir o portátil e ficar no Abelton Live, meio autista, até me chamarem de volta para o mundo responsável… é o que está a acontecer agora, por isso é meio inevitável! E depois não consigo não começar com colaborações, a passar a bola para outros sítios e a ver o que vem de lá. É o desafio que acaba por gerar um movimento de centrifugação do meu cérebro.

 

Vês-te a participar noutro coletivo artístico, como fizeste durante dez anos em Buraka Som Sistema?

Eu acho que é interessante a afirmação da individualidade. Eu via-me, cada vez mais, a experimentar mais coisas com mais pessoas. O espaço que se criou na minha vida desde o fim dos Buraka também me permitiu produzir para várias pessoas, que vão da M.I.A. até ao Diogo Piçarra, por exemplo. Acho que já existe informação suficiente: já se ouve de música eletrónica que vem de Seoul, da África do Sul, por isso começou-se a juntar conteúdo e tornar-se “normal” consumir música eletrónica com informação. É dessa forma que me vejo a trabalhar: mais como um curador de individualidades, do que propriamente querer afirmar um coletivo de pessoas que falam numa só voz — que é sempre complicado de gerir.

 

“Sinto que estou com vontade de me sentar a fazer música nova. Começo a agarrar todos os intervalos possíveis e imaginários para abrir o portátil e ficar no Abelton Live, meio autista, até me chamarem de volta para o mundo responsável… é o que está a acontecer agora, por isso é meio inevitável [um disco novo]!”

 

Também tens um projeto televisivo prestes a ir para o ar. É o quê?

Não é um formato super-secreto: quem acompanhou as minhas coisas, se calhar até já conseguiu ver na mini-série que criámos quando se gravou o Atlas, com cinco episódios, um em cada cidade em que o disco foi gravado. Aqui é parecido, um formato de programa de viagens — mais visto na comida — mas aqui apontado à música e a estas “mini-cenas” em ebulição em diversos pontos do mundo fora.

 

Em que pé é que isso está?

Já está tudo filmado — pelo João Pedro Moreira — e estamos agora em fase de pós-produção, com colagens, montagens, legendas e grafismos… estou super orgulhoso do projeto, que é das coisas mais fora que já fiz. É interessante poder mostrar esta nossa filosofia através de outras formas de entretenimento, porque nem toda a gente consome música. Estamos ainda à espera de notícias para ver quando vamos tomar conta da televisão!

 

Entrevista: Bruno Martins