Oub'lá

Chinaskee & Os Camponeses

A cantar as partes boas e más do ser humano: diversões e destroços amorosos

 

Foi há um par de anos que Miguel Gomes começou a aliviar tensões interiores, amarguras e excitações com a escrita de canções. Juntou-se a Luís Tojo e a mais uma séire de amigos – que faziam o mesmo que ele – e criaram uma editora para se apoiarem uns aos outros nas edições. Miguel Gomes, que assinava como Alex Chinaskee – uma homenagem a duas inspirações de gerações diferentes – foi largando algumas demos, experiências e EPs, mas a precisar de ajuda para tocar ao vivo. Depois de editar O Campo, Miguel chamou Simões (Trovador Falcão), Tojo (SunKing), Oliveira e Ramos para o acompanharem na jorna: são os Camponeses de Chinaskee (que agora já deixou cair o “Alex”) que integram este coletivo que floresce na cidade, mas que olha com as guitarras e teclados para um pôr-do-sol bucólico.

Por altura do lançamento do primeiro álbum com banda, Malmequeres, Miguel Gomes e Luís Tojo apresentam-nos a história desta banda que no próximo dia 20 de outubro vai estar no Musicbox, em Lisboa, a desfolhar este Malmequeres.

Podemos começar por perceber como é que nasce este projeto?

Miguel Gomes (Chinaskee) – Ele (Luís Tojo) teve a ideia de fazer uma editora, a French Sisters. Antes disso era uma banda que tínhamos os dois. Essa editora foi mais para gravar os amigos e lançá-los…

 Então primeiro nasceu uma editora e só depois é que nasceu Alex Chinaskee?

Luís Tojo (SunKing) – Foi uma ideia para juntar mais projetos novos. Tínhamos acabado a banda de liceu e não sabíamos o que fazer. Toda a gente tinha projetos, toda a gente tinha ideias – tal como o Miguel teve as suas. E o plano era juntar músicos.

 Então como é que se desenvolve a ideia da banda?

Chinaskee – Nós também queríamos um sítio onde pudéssemos lançar a nossa própria música e foi isso que fizemos. Eu comecei a escrever umas canções, acabei por gravar o disco praticamente todo sozinho, só com a ajuda do baixista – porque só não sei tocar baixo e teclados.

SunKing – A banda começou por ser o Miguel sozinho. A ideia era ser o Alex Chinaskee – a personagem dele – com as canções que escreveu. Entretanto, quando surgiu o EP O Campo, ele precisava de uma banda para o tocar ao vivo e começou a juntar alguns colegas e amigos, uma banda.

 

“Não queremos ser mais uma banda psicadélica. Então fizemos uma mistura de ideias em que algumas delas eram mais psicadélicas, outras mais pop, dançantes ou experimentais. E o Malmequeres é isso tudo!”

 

Malmequeres é então o primeiro trabalho de Chinaskee com banda – depois de Campo e Trocadinhos ao Pôr-do-Mi. Agora com os Camponeses, este disco são os malmequeres a florir no campo?

Chinaskee – Demorámos algum tempo a decidir o nome do filme. Tínhamos o produtor na cabeça, as canções escritas, canções em inglês que se passaram para português… Tivemos muitas ideias, cinquenta e tal nomes – que é o que fazemos normalmente para tudo – e decidimos no fim. O nome é em honra ao Campo, mas também em honra ao Trocadinhos Ao Pôr-do-Mi… que é um trocadilho: pôr-do-sol/pôr-do-mi; e eu sou o Mi-Guel (risos)…

 E agora com banda, como é que tudo isto funciona?

SunKing – É a primeira vez que há esta dinâmica de banda, não só a tocar, mas também em composição e em trabalho de dinâmicas de arranjos. É um tentar perceber como é que tudo isto vai funcionar em estúdio: em teoria é fácil, mas com tantas ideias que tínhamos acabou por dificultar e ser mais divertido.

 

 Ao ouvirmos os disco encontramos vozes uivantes, ecoantes, teclados etéreos e guitarras psicadélicas. Quase como se fosse uma corrida em câmera lenta numa plantação de feno. É dentro deste universo psicadélico que se enquadra a personagem Chinaskee?

Chinaskee – Nós gostamos todos de música psicadélica…

SunKing – Seja lá o que isso o que for…

Chinaskee – … mas não queremos ser mais uma banda psicadélica. Então fizemos uma mistura de ideias em que algumas delas eram mais psicadélicas, outras mais pop, dançantes ou experimentais. E o Malmequeres é isso tudo!

SunKing – E, por exemplo, há riffs de guitarra que, na nossa opinião, podem ser totalmente psicadélicos e para outras pessoas é só parolo. E vice-versa, claro. Isso do “psicadélico” e “neo-psicadélico” às vezes também me soa um bocado só a tolo.

 

“Ficámos o dia todo a gravar vozes e guitarras com o reverb da casa de banho. Foi no primeiro dia de férias do verão do ano passado: os meus pais tinham acabado de sair de casa e ficámos das 10h às 3 da manhã a gravar enfiados no WC até ficar alguma coisa palpável”

 

Em que condições aconteceram as gravações destes temas?

Chinaskee – Começou tudo com uma música que foi um riff que escrevi logo após ter lançado o primeiro disco e que ficou meses e meses na minha cabeça. Só depois é que cheguei ao pé do Tojo e mostrei. Ele não gostou, mas ficámos o dia todo a gravar vozes e guitarras com o reverb da casa de banho. Foi no primeiro dia de férias do verão do ano passado: os meus pais tinham acabado de sair de casa e ficámos das 10h às 3 da manhã a gravar enfiados no WC até ficar alguma coisa palpável.

 Quantas canções é que sairam dessa sessão de casa-de-banho?

Chinaskee – Uma.

SunKing – Foi a primeira demo que tínhamos. De facto eu não gostava muito do que ele me mostrou, mas estivemos a falar de que forma é que a podíamos mudar para passarmos a gostar os dois. Foi o primeiro momento para o resto do disco, porque foi também a primeira vez em que o Miguel [Chinaskee] não esteve a escrever sozinho.

 Essa ideia de irem gravar para a casa de banho é logo definidora daquilo que pretende ser o som de Chinaskee & os Camponeses: com os ecos e as reverberações que se encontram, por exemplo, numa casa de banho.

Chinaskee – Foi exatamente o que lhe disse: “No outro dia estava na casa de banho, bati umas palmas e tinha um grande reverb, por isso vamos gravar aqui!”

SunKing – Sim, é uma “imagem de marca” da banda: ecos e reverbs… apesar de muito vagas e abstratas, já tínhamos algumas ideias para o que iria ser mais tarde a estética do disco.

 Além de vocês os dois, quem é que faz parte, hoje, da banda?

Chinaskee – O David, que é o nosso baixista – a terceira parte do power trio, somos maioritariamente os três que fazemos as coisas. Depois o Ricardo, que toca bateria, e o Bernardo, que é guitarrista.

 Quem é que é esta personagem, o Alex Chinaskee?

Chinaskee – “Chinaski” é o alter-ego do [Charles] Bukowski, um escritor de quem eu gosto muito. Na altura só tinha lido um livro dele – mas agora já aumentei um bocado mais a minha cultura. E pareceu-me um bom nome para o projeto. O “Alex” vinha de um dos meus maiores ídolos – o Alex Turner [Arctic Monkeys] – mas acabámos por perceber que não se identifica muito com o que estamos a fazer: é mais giro termos um nome floreado do que ter só um nome comum. O Chinaski é uma personagem de coração partido; está sempre atrás de mulheres, álcool e drogas. E mesmo que não sejamos assim, acaba por ser uma personagem mágica porque se identifica com as partes más e boas do ser humano: as diversões e os destroços amorosos.

Existe muito de literário naquilo que se escreve em Chinaskee? São textos muito poéticos?

Chinaskee – Não sei… não quero dizer coisas de que me possa arrepender.

 Então pergunto ao SunKing. O que achas?

SunKing – Eu às vezes ajudo a escrever, portanto também sou suspeito. Mas o Miguel [Chinaskee] tem uma forma muito característica de escrever letras e tem um bocado uma associação ao Chinaski original: escreve sem grandes rodeios, só com os sentimentos.

 

“‘Chinaski’ é o alter-ego do [Charles] Bukowski, um escritor de quem eu gosto muito. Na altura só tinha lido um livro dele – mas agora já aumentei um bocado mais a minha cultura. O ‘Alex’ vinha de um dos meus maiores ídolos – o Alex Turner [Arctic Monkeys]”

 

Os “rodeios” e as viagens ficam para o lado musical da banda. É mais confortável estar agora a tocar com os amigos ou tens preferes estar a solo, como estiveste por exemplo, no Trocadinhos…?

Chinaskee- Em disco é diferente. Gosto de estar em estúdio, a gravar, ter o meu tempo para pensar nas coisas que quero fazer… o Trocadinhos, apesar de ser super lo-fi era exatamente o que estava à procura de fazer: som mais lixado possível, gravado de propósito para soar mal. Em estúdio sinto-me confortável de qualquer das formas. Ao vivo preciso de ter alguém ao meu lado!

 E a personagem acabou por ajudar a definir melhor a identidade da banda?

SunKing – Acho que sim. Em palco podemos ser outra pessoa e quando estamos em palco é um bocado isso: sermos nós na pele de outra pessoa.

Chinaskee – Eu quando dou um concerto não quero que as pessoas estejam só a ver alguém a tocar: quero que as pessoas vejam um espetáculo. Se for para ouvir música, podem fazê-lo em casa, por isso faço muita questão que os concertos sejam muito diferentes daquilo que se ouve no disco.

 O disco tem a produção do Filipe Sambado.

Chinaskee – Sim, gravámos o disco de uma maneira diferente. Primeiro com banda inteira, claro. O Sambado já tinha produzido imensas coisas de que já tínhamos gostado: o Luís Severo, o Alek Rein, Primeira Dama… é um som que mostra amor ao trabalho; não é aquela coisa crua de ir para o estúdio e não ouvir nem um único erro… encontro muito conforto nas coisas que o Sambado grava. E para quem não pode ver o nosso espetáculo, ao menos ouçam o espetáculo que está o nosso disco!

Entrevista: Bruno Martins