O exercício da Medicina, outrora baseado na tradicional relação médico-doente, evoluiu para a prestação de cuidados de Saúde exercida por seres humanos, naturalmente falíveis, mas operando hoje no seio de organizações complexas e com recurso a tecnologias cada vez mais sofisticadas. Esta mudança associada à natureza marcadamente incerta da biologia do Homem doente cria um enorme potencial para a ocorrência de erros. A Medicina Clínica é hoje, mais do que nunca, a “ciência do incerto e a arte da probabilidade” Osler.

O livro “O Erro em Medicina” aborda os Erros da Medicina, ponte de um enorme iceberg oculto. Estuda os seus mecanismos de ocorrência, em moldes gerais e a propósito de cada especialidade médica, que vai ilustrando com exemplos. Aborda o erro na perspetiva individual e na do sistema, abrindo horizontes para uma análise séria dos acidentes numa fundamental ótica organizacional. Aborda ainda os conflitos éticos em torno do Erro, o modo como os média olham os erros ligados à Saúde e ainda, o tratamento jurídico que deverá ser dado ao Erro Médico, na sua distinção fundamental com a negligência. A mensagem deste livro pretende ser clara: na Medicina os erros são inevitáveis e a sua análise deverá incidir mais sobre os vícios do sistema e menos sobre a tão banalizada, culpabilização dos indivíduos. A fiabilidade e a qualidade de uma organização médica residem fundamentalmente no modo como sabe lidar com os seus erros, minimizando as suas consequências e aprendendo a preveni-los.

Erro médico. A expressão é popular, mas também equívoca. «Os erros ocorrem no sistema de saúde, por vezes são responsabilidade dos médicos, outras do sistema, outras de elementos do pessoal que não os médicos», sublinha José Fragata. «Por isso, o mais correto é falarmos em erros na saúde», refere ainda este especialista, autor do livro «O Erro em Medicina».  Mas as responsabilidades são também partilhadas pelo doente. Não só existem várias medidas que pode tomar para assegurar a qualidade dos cuidados que lhe são prestados, como fazê-lo é um dos seus principais deveres, enquanto paciente. «É essencial que os médicos tenham noção de que não são infalíveis, que estejam alerta e tenham uma atitude proativa», da mesma forma que «os doentes devem ter uma atitude atenta e inquisitiva, colocando perguntas». Isto sem esquecer que também os dados que fornecem (ou omitem) aos profissionais de saúde vão interferir na escolha e curso do tratamento.

Doente informado, paciente empenhado

Segundo a Agency for Healthcare Research and Quality, departamento do governo norte-americano, «pacientes pouco envolvidos e informados têm menor probabilidade de aceitar o tratamento do médico e de fazer o que é necessário para que o funcione». Desta forma, «uma boa comunicação entre o doente e o profissional de saúde é fundamental para obter cuidados de enfermagem, farmacêuticos ou médicos eficientes».

Erros e complicações

Na origem dos erros na saúde interagem componentes individuais, de sistema e/ou de ambiente. Por exemplo, «se num departamento de urgência entram, de repente, 100 doentes isso cria um ambiente mais propício a erros», exemplifica José Fragata. Para este médico, o erro é «uma falha não intencional de realização de uma sequência de atividades físicas ou mentais previamente planeadas e que, desta forma, falham em atingir o resultado esperado». 

Assim, distingue-se dos casos de violação de regras (como a negligência médica) e «pode ocorrer sem consequências negativas para os doentes». Na verdade, apenas uma minoria dos erros resulta em danos ou outros eventos adversos. Em cada 100 internamentos hospitalares existem dez erros. Desses, 70 por cento não resulta em eventos adversos, em 25 por cento pode haver complicações transitórias e em cinco por cento há complicações graves.

Áreas críticas

Os erros podem ocorrer em qualquer setor, dos procedimentos simples aos mais complexos. A medicação «corresponde a, pelo menos, um terço de todos os eventos
adversos»
afirma José Fragata. Da prescrição à dispensa do medicamento, passando pela administração, são muitas as oportunidades para que algo falhe, pelo que o papel proativo do doente se reveste de especial importância, destaca José Aranda da Silva.

Descubra como os fármacos prescritos a podem mesmo ajudar. «Os doentes portugueses estão sobre medicados, nomeadamente em relação a antidepressivos e ansiolíticos. É culpa dos doentes, dos médicos e uma questão de cultura. É mais fácil medicar um doente do que ouvir meia hora de conversa», conta José Fragata. Sobretudo se está a tomar vários medicamentos, pergunte ao médico se são todos são necessários, as alternativas existentes e quais os custos e benefícios de cada uma. Certifique-se de que percebe a letra e a linguagem do médico (tarefa que agora está facilitada pela prescrição eletrónica). A transferência automática de dados «diminui erros de transcrição e permite um melhor tratamento dos dados por parte do Serviço Nacional de Saúde», refere. Se não entender algo que o seu  médico lhe diz, pergunte.

«O farmacêutico deve ser informado sobre a sua história atual de saúde e da medicação», refere este especialista. Se tiver que visitar uma farmácia nova, «é importante informar o farmacêutico, tão exatamente quanto possível, sobre a sua história clínica ou fornecer-lhe uma cópia da sua medicação», acrescenta.

O que deve fazer no hospital

Antes de uma cirurgia certifique-se de que o cirurgião sabe exatamente qual é o seu caso, a área a operar, aconselha a American Academy of Medical Physicians (AAMP). Tentando não ferir suscetibilidades, «pode dizer, enquanto ainda estiver acordado, para não se esquecerem que sofre desta patologia e deste lado», sugere José Fragata. No entanto, «os doentes, quando vão para o bloco, devem ir com o local da cirurgia marcado com tinta própria. Isso, hoje em dia, é uma das verificações obrigatórias do chamado checklist  cirúrgico», refere ainda.

Elimine possíveis focos de infeção. Objetos como flores e joias estão interditos da generalidade dos quartos de hospital por promoverem a presença de bactérias.