Duas enfermeiras do Porto denunciaram este fim-de-semana no jornal Público uma situação insólita: quando foram chamadas para consultas de saúde ocupacional, tiveram de comprovar que estão a amamentar, espremendo leite das mamas em frente aos médicos.

Perplexas e indignadas, reclamaram para várias entidades, que lhes deram razão, mas para já nenhuma se dispôs a prestar-lhes algum tipo de apoio jurídico. O conselho que lhes dão é, tão só, o de que, no futuro, se recusem a fazer tal prova.

Maria dos Anjos Teixeira, 34 anos, há 12 a trabalhar no Hospital de Santo António, no Porto, foi uma das enfermeiras convocada em Fevereiro para comparecer numa consulta de saúde ocupacional, depois de o seu filho ter completado um ano de idade.

A história que conta é, no mínimo, bizarra. No papel, o objetivo de tal consulta seria apenas o de garantir a “proteção e vigilância da saúde e segurança” das grávidas e lactantes. “Dizem-nos que é para avaliar os riscos a que estamos expostas, por exemplo a radiações ou químicos. Mas eu trabalho nos cuidados intensivos e o único risco que corro é o de contacto com objetos cortantes e perfurantes”, explica.

A médica de saúde ocupacional ter-lhe-á perguntado, de seguida, desde quando estava a amamentar. “Fiquei estarrecida e em simultâneo preocupada, porque isto demonstra perfeita ignorância sobre a amamentação em si. Respondi que desde que o meu filho nasceu, claro!”. Depois disso, conta, a médica disse-lhe que iam ver “se tinha leite”.

A legislação portuguesa obriga as mulheres que estão a amamentar a entregar uma declaração médica todos os meses depois de as crianças completarem um ano de idade.

Antes disso, têm dispensa de duas horas por dia (no máximo) para amamentar ou fazer a aleitação (quando o leite é dado em biberão) dos seus filhos, sem necessidade de apresentar qualquer documento.

O que a lei não exige é que as lactantes “andem a provar por esguicho” que têm leite, indigna-se Maria dos Anjos, que diz que ainda começou por protestar, mas acabou por submeter-se à “dita prova”. “Pus a mama de fora e espremi”, descreve. Porquê? “Para não acharem que o facto de reclamar significa que não amamento”, justifica a enfermeira, que faz questão de deixar claro que considera esta estratégia “absurda e ilegal”. “É bullying”, diz ainda.

Fraudes detetadas
Indignada com a primeira prova de evidência de leite, a enfermeira, que é conselheira de amamentação, ficou mais agastada quando lhe apresentaram uma convocatória para nova prova, a efetuar no prazo de três meses.
“Isto é claramente perseguição. Não lhes chega perceber que efetivamente estou em situação regular como me exigem presenças trimestrais?”, pergunta.

Sublinhando que compreende que é necessário cumprir a legislação, não se conforma, porém, com “o princípio subjacente que dita que investiguemos a este ponto”. “Não tarda teremos de trazer um dedo para comprovar o falecimento de algum familiar.”

Desde que começou a pedir provas, o Hospital de S.João comunicou que detetou que metade das licenças seriam fraudulentas.