“O MFA está com o povo”


As campanhas de dinamização cultural consubstanciaram-se em ações desenvolvidas por militares e civis que pretendiam estreitar laços fraternos entre os militares e as populações locais com insuficientes recursos monetários e materiais. Foram dinamizadas pela Comissão Dinamizadora Central (CODICE) tutelada pela 5ª Divisão do Estado-Maior-General das Forças Armadas.


DINAMIZAÇÃO CULTURAL – O MFA está com o Povo…

O programa das campanhas de Dinamização Cultural foi apresentado a 23 de outubro de 1974, na vigência do 3º Governo Provisório, chefiado por Vasco Gonçalves, no Palácio Foz, em Lisboa. Seria coordenado pela Comissão Dinamizadora Central (CODICE), uma estrutura da 5ª Divisão do Estado Maior das Forças Armadas, em colaboração com a Direcção Geral da Cultura e Espectáculos.

O objectivo deste programa era fortalecer a aliança entre o Povo e o MFA, assumido como um movimento libertador. As Campanhas de Dinamização Cultural e Acção Cívica do MFA foram idealizadas para serem uma ferramenta no fortalecimento desta relação que condensava os ideais da facção progressista do MFA. O seu programa apontava várias linhas a abordar no contacto com as populações – a luta antifascista, o programa do MFA, o apoio às Forças Armadas, a isenção partidária e a análise e discussão da problemática nacional. Mas todos estes problemas deviam ser abordados com “inteligência política”, considerando “que cada comunidade possui uma cultura própria que não deve ser agredida. Pretende-se levar informação e estabelecer um diálogo que permita a participação no processo de democratização em que o País se encontra envolvido a partir dos problemas efectivamente vividos por essa comunidade”.

Uma das primeiras acções teve lugar em Novembro no distrito da Guarda, com cadetes da Academia Militar, seguindo-se, em Janeiro de 1975, a operação nortada, nas regiões de Bragança, Vila Real, Lamego e Viseu.

O modelo inspirador desta iniciativa foi a acção psicossocial utilizada na guerra colonial, que muitos militares haviam praticado nas suas comissões em África. Consideravam-se por isso em condições de desenvolver uma acção desse nível no seu país, “com os seus compatriotas”.

Até ao 11 de Março as campanhas basearam-se sobretudo na itinerância, sendo o seu objectivo, para além do contacto com as populações rurais, o levantamento de problemas e carências dessas populações.

Ainda no mês de Janeiro foram iniciadas outras acções, uma no distrito de Castelo Branco e outra no Minho, esta denominada “operação verdade”. Até ao 11 de Março foram ainda iniciadas acções no Alto Minho (operação alvorada) e no interior algarvio (operação povo culto). Esteve também prevista uma operação para os Açores (acção Atlântida), mas foi suspensa devido aos acontecimentos do 11 de Março.

Depois do 11 de Março as campanhas foram reestruturadas, incorporando uma componente de acção cívica e privilegiando a fixação de meios técnicos e culturais em determinadas regiões, alteração baseada nos ensinamentos da fase anterior. Fizeram-se campanhas em Viseu, Bragança (Maio-Nordeste) e Guarda. Para além das sessões de esclarecimento político os militares faziam intervenções no campo das infra-estruturas e do apoio médico-sanitário, sendo as campanhas acompanhadas por artistas e outos agentes, que contemplavam áreas culturais, como o teatro, o cinema, a música, etc. Nestas acções, as campanhas tinham o apoio das populações e foram bem-vindas de uma forma geral.

Por outro lado, as campanhas do MFA sofreram muitas resistências e acumularam muitos problemas e erros. Os caciques e forças do antigo regime, dominantes ainda em muitas aldeias do interior, levantaram as populações contra elas. O desconhecimento de alguns militares do ambiente e das características das populações criou focos de tensão e de rejeição. Apesar disso, acabaram por ser realizadas obras importantes e resolvidos problemas que se arrastavam há anos.

No final de 1974, o jornal do MFA, Movimento definia assim os objectivos e a experiência já recolhida das acções de dinamização cultural efectuadas no distrito da Guarda: “Agora sabemos todos como é difícil a vida nestas terras. Estrada. Assistência sanitária. Escolas. Agricultura. Indústria. Emigração. Todo um duro trabalho de reconstrução à nossa frente. Somos um povo antigo. Temos uma longa história. Já ultrapassámos inúmeras dificuldades […] Sabemos bem que no Distrito da Guarda se torna urgente uma acção decidida para libertar o povo. Vimos e ouvimos os caciques, os ex-ANP, os ex-Pides, alguns elementos reaccionários do clero solidamente implantados nas comunidades, explorando a boa-fé e o pouco esclarecimento do povo para, a coberto de mascaradas “democráticas”, o enganarem […] Sabemos que a realidade política do Distrito da Guarda se estende a outras regiões do País. E estamos bem conscientes do perigo que representa no caminho da democratização em que estamos intransigentemente empenhados”.

O responsável da campanha de Castro Daire, que se prolongou até 1976, anotou as principais carências das populações e as condicionantes da sua acção: “Obscurantismo do povo em geral; actividade perniciosa do clero, sua ignorância política e desinteresse pelas realidades sociais, sua incapacidade de compreensão da dinâmica da revolução; métodos fascistas, de caciquismo, pressões sociais, recurso à posição social, ao lugar, etc., para a adesão ao voto das populações, anunciando-lhe tempos apocalípticos, aconselhando-lhe a renúncia, a agressão ao esclarecimento político”.

Em suma, as campanhas de dinamização cultural, iniciadas em Outubro de 1974 e prolongadas até 1976, tinham como razões estratégicas divulgar o programa do MFA, esclarecer as populações quanto ao acto cívico de votar, e dar dimensão nacional ao 25 de Abril. Foram realizadas mais de 2.000 acções de dinamização cultural e acção cívica.

Fonte: Aniceto Afonso, Carlos Matos Gomes e Maria Inácia Rezola.


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