Em média, em Portugal, morre uma pessoa a cada duas horas vítima de um enfarte do miocárdio, de um ataque cardíaco. No consultório médico de hoje vamos falar desta doença, das suas principais causas e de como a prevenir. Além disso, vamos saber como está a ser feito o acompanhamento aos doentes após terem sofrido um enfarte.Para esta conversa contamos com o médico Cardiologista, o Dr. Miguel Mendes. Para participar no nosso programa e colocar questões ligue o 910 106 359.  

O que é?
Enfarte do miocárdio é a designação também dada a um “ataque cardíaco”. Ocorre quando uma ou mais artérias que irrigam o coração ficam bloqueadas e este órgão não recebe sangue e oxigénio nas quantidades que necessita. Nestas condições, as células da área afetada morrem. Um enfarte do miocárdio é uma emergência médica que requer tratamento imediato. 

A maioria dos enfartes do miocárdio é causada por coágulos que, por sua vez, resultam do processo de aterosclerose, que envolve estreitamento e rigidez das artérias. A presença de níveis elevados de triglicéridos e de colesterol LDL conduz à formação de placas no interior das artérias, reduzindo o fluxo sanguíneo. 

Nas últimas duas décadas, tem-se verificado na população portuguesa uma redução significativa na taxa de mortalidade por doenças cardiovasculares ou do aparelho circulatório. Mesmo assim, estas patologias são ainda a principal causa de óbito em Portugal, e em todos os países europeus. Em 2011, a taxa de mortalidade por enfarte do miocárdio em Portugal foi de 24,2 casos por 100 mil habitantes, com 4366 mortes. 

Sintomas
Os enfartes do miocárdio podem manifestar-se de diversas formas, por vezes bastante enganadoras. As mais comuns são uma dor em forma de aperto, sensação de peso ou pressão no centro do peito. A dor tende a irradiar para as costas, braço esquerdo, maxilar ou pescoço. A respiração torna-se irregular e rápida, bem como o ritmo cardíaco. Ocorrem tonturas, fraqueza, náuseas e vómitos, sudação e sensação de pânico. 

Causas
O enfarte do miocárdio resulta da interrupção do fluxo de sangue para o coração com consequente morte do tecido não irrigado. A causa mais comum para esse bloqueio é a aterosclerose. Para ela contribuem fatores como a hipertensão arterial, níveis elevados de colesterol LDL (o “mau” colesterol), acumulação do aminoácido homocisteína, tabaco, diabetes e inflamação crónica. 

Noutros casos, o fluxo de sangue até ao coração é interrompido por um espasmo numa artéria coronária. 

Os principais fatores de risco são o tabaco, uma dieta rica em gorduras, presença de níveis elevados de colesterol LDL, falta de exercício físico, excesso de peso, antecedentes familiares de enfarte, diabetes, hipertensão arterial, stress e, no caso das mulheres, a menopausa. 

Diagnóstico
Perante sintomas sugestivos de um enfarte do miocárdio, é essencial recorrer de imediato a um hospital. Quando mais tempo passar, menores são as possibilidades de recuperação. O diagnóstico baseia-se na avaliação clínica, no electrocardiograma e análises ao sangue. Podem ser solicitados exames adicionais, como uma radiografia ao tórax, ecocardiograma ou um cateterismo cardíaco. 

Tratamento
O objetivo é restabelecer o fluxo sanguíneo interrompido, de modo a preservar o mais possível o músculo cardíaco e a sua função. 

 A nitroglicerina tem uma ação vasodilatadora e é útil enquanto se aguarda a chegada da equipa de emergência médica. No hospital, são utilizados medicamentos e/ou técnicas que permitem desbloquear a artéria entupida, como a angioplastia. 

No contexto hospitalar, alguns dos medicamentos prescritos são a aspirina, que ajuda a impedir a coagulação do sangue, nitroglicerina, analgésicos, agentes trombolíticos, que dissolvem os coágulos e que devem ser administrados nas primeiras duas horas após o enfarte, e anticoagulantes, como a heparina. 

Em certos casos, a cirurgia pode ser necessária. Nela incluem-se os cateterismos seguidos de angioplastia, que consiste na dilatação da artéria ocluída com a colocação de uma estrutura (stent) que a mantém desobstruída, ou um enxerto (bypass) que permite contornar a artéria obstruída e restabelecer o fluxo sanguíneo. 

Após a alta hospitalar, são essenciais alterações importantes no estilo de vida (dieta e exercício) bem como o uso de medicamentos que reduzam o risco de novos episódios. Nesses fármacos, incluem-se os inibidores da enzima conversora da angiotensina, que dilatam os vasos sanguíneos, os beta-bloqueantes, que reduzem a frequência cardíaca e a pressão arterial e as estatinas, que ajudam a diminuir os níveis de colesterol. Podem também ser úteis a niacina ou os sequestradores de ácidos biliares, que ajudam a reduzir o colesterol, os fibratos que permitem controlar os níveis de triglicéridos, e os anticoagulantes, que impedem a formação de coágulos. 

Prevenção
É possível reduzir o risco de ocorrência de um enfarte do miocárdio deixando de fumar, realizando exercícios aeróbicos (caminhar, nadar, andar de bicicleta) durante, pelo menos, 30 minutos diários, cinco dias da semana, reduzindo os níveis de stress e adotando uma dieta saudável, pobre em gorduras saturadas e rica em fruta, vegetais e cereais. A manutenção de um peso adequado é igualmente muito importante. 

Se o paciente tiver hipertensão arterial, diabetes ou colesterol, é essencial tratar e controlar essas condições já que tendem a aumentar o risco de um enfarte. 

Fonte:
www.cuf.pt 

ESTUDO
Acompanhamento dos doentes pós-enfarte do miocárdio em Portugal: Doenças cardiovasculares a principal causa de morte do país! 

No âmbito do Dia Mundial da Saúde, passado 1 ano, o que foi feito face às conclusões e recomendações do projeto da IQVIA (empresa de tratamento de dados para a área da saúde) sobre o acompanhamento dos doentes pós-enfarte do miocárdio em Portugal? Sendo as doenças cardiovasculares a principal causa de morte do país, alguma coisa mudou? 

O “Post MI – Reshaping in Portugal” teve como principal objetivo avaliar o percurso do doente pós-enfarte do miocárdio em Portugal, uma doença que diariamente mata, em média, mais de 12 pessoas no país. 

Este projeto mapeou o percurso do doente e os cuidados de saúde após um enfarte do miocárdio e identificou recomendações para melhorias significativas nesse processo com a colaboração de especialistas e profissionais de saúde da área na avaliação do progresso e dos desafios enfrentados no acompanhamento desses doentes, testemunhos de pacientes, análise de dados face ao número de ocorrências, tempos de espera e adesão a programas de reabilitação cardíaca. 

Do mapeamento feito aos hospitais concluiu-se que: 

  • Apenas alguns hospitais portugueses possuem um centro especializado de reabilitação cardíaca, essa rede não é conhecida e a referenciação não está organizada a nível nacional; 
  • Em hospitais menos especializados, a reabilitação cardíaca não existe e o acompanhamento após evento agudo é mais frágil, com menos médicos disponíveis a nível hospitalar e uma grande distância das populações ao hospital de referência; 
  • Onde existe reabilitação cardíaca, a adesão dos doentes a estes programas está dependente da facilidade em compatibilizar o acompanhamento com o regresso à normalidade; 
  • Não existem orientações oficiais para o seguimento dos doentes pós-enfarte do miocárdio em Portugal; 
  • Alguns hospitais possuem protocolos próprios para o tratamento destes doentes e outros não e existem grandes desafios na disponibilidade e alocação de recursos à prevenção secundária. 

 

Por isso, são vários os intervenientes que podem e devem fazer a diferença na vida dos doentes pós-enfarte do miocárdio e a recomendação, após a alta, recai sobre: 

  • A cardiologia, para que sejam feitas consultas regulares (1º mês, 6 meses e 1 ano após o evento) para garantir a recuperação e evitar a reincidência de um novo evento; 
  • A reabilitação cardíaca, sendo necessário criar um programa estruturado de acompanhamento do utente após a alta, conduzido por uma equipa multidisciplinar de profissionais de saúde, numa fase intra-hospitalar e no 1º mês após o evento; 
  • As mudanças de estilo de vida, sendo necessário desenvolver consultas de especialidade de cessação tabágica, psicologia e nutrição para motivar o doente a transformar a sua vida: 
  • O Médico de Medicina Geral e Familiar, através de um acompanhamento regular para ajustar a terapêutica às necessidades específicas de cada doente e controlar fatores de risco. 

Estes foram resultados e recomendações apresentados há 1 ano sobre a realidade em Portugal. E passado esse tempo? Qual é o ponto de situação atual face ao acompanhamento dos doentes pós-enfarte do miocárdio? Temos verificado menos ocorrências, melhor acompanhamento, menores tempos de espera e maior número de programas de reabilitação cardíaca nos hospitais? 

MIGUEL MENDES 

O Dr. Miguel Mendes já foi diretor do Serviço de Cardiologia do Centro Hospitalar da Lisboa Ocidental-CHLO, Coordenador da Unidade de Reabilitação Cardíaca do Serviço de Cardiologia do CHLO, Presidente do Colégio de Cardiologia da Ordem dos Médicos e Presidente da Sociedade Portuguesa de Cardiologia (SPC). 

Atualmente, é Coordenador do Serviço de Cardiologista, na CUF Belém, cujas especialidades são Cardiologia, Fisiopatologia do Esforço e Reabilitação Cardíaca. 

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