Em setembro, nascem mais bebés nos países do hemisfério Norte. Porquê? Porque passaram nove meses desde as épocas festivas do Natal e passagem de ano e o seu, agora cientificamente provado (estudo feito por uma equipa de investigadores do Instituto Gulbenkian de Ciência (IGC) e da Universidade de Indiana, nos EUA), espírito fértil.

Em relação às procuras por sexo na Internet, a investigação apoiou-se num serviço oferecido pelo Google, chamado Google Trends, que permite conhecer como variam as pesquisas por determinado termo ou tema, ao longo do tempo e em muitos países. Com a análise dos padrões de pesquisa, foi fácil perceber que o interesse em sexo não é uniforme ao longo do ano.

“Até agora pensava-se que o pico nas conceções se devia a uma adaptação biológica aos dias curtos e frios de Inverno, uma vez que nos países do Norte o solstício de Inverno ocorre em dezembro. Contudo, a inexistência de dados precisos de diferentes partes do mundo não permitia testar esta hipótese”, refere o comunicado do Instituto Gulbenkian de Ciência (IGC), em Oeiras, sobre o estudo.

A hipótese da adaptação biológica não foi testada neste estudo, mas, em vez disso, os investigadores procuraram algo preciso, o interesse por sexo, na maior fonte de informações que existe atualmente: a Internet. “É relativamente fácil encontrar registos de nascimento fiáveis em países ocidentais do hemisfério Norte, mas isso não é necessariamente verdade no resto do mundo. Isto tem enviesado as análises feitas, limitando-as a uma região e cultura, e condicionando fortemente o nosso conhecimento do mundo. No entanto, hoje em dia toda a gente usa a Internet e as redes sociais, independentemente da sua localização ou cultura. Esta realidade está a gerar dados muito úteis para investigação”, explica Joana Gonçalves Sá, investigadora no Laboratório de Ciência e Política do IGC, no comunicado.

Foi assim que chegaram à conclusão de que, afinal, será a cultura e os estados de espírito coletivos que parecem guiar os comportamentos das pessoas em determinadas alturas mais festivas do ano e que, mais tarde (especificamente nove meses mais tarde), podem ter consequências.

A análise da equipa coordenada por investigadores do Instituto Gulbenkian de Ciência e da Universidade do Indiana não podia ser mais oportuna. A conclusão, que para alguns pode servir de aviso, é que o interesse no sexo atinge um pico nas alturas de celebrações culturais e religiosas e que a prova (teórica) disso está num maior número de pesquisas da

palavra “sexo” e outros termos sexuais na Internet. A outra prova, prática, encontra-se – como já dissemos – no aumento de registo de nascimentos em setembro.

“Inicialmente fizemos um estudo de muitos termos, mas provámos que procurar apenas pela palavra ‘sexo’ é um substituto ótimo para procuras sobre sexo, pornografia, isto é, o padrão da procura da palavra ‘sexo’ está altamente correlacionado com outras procuras relacionadas com sexo, por isso basta usar a procura sobre esta palavra”, explica Luís Rocha. Não sabemos quantas vezes as pessoas pesquisam a palavra sexo nesta altura, porque o Google não publica o volume exato de procuras sobre determinada palavra, mas apenas a proporção da procura dessa palavra em relação a todas as outras. No entanto, confirma-se “um grande pico na proporção da palavra ‘sexo’ no Natal em relação a outras semanas”, sublinha Luís Rocha, adiantando ainda que “a diferença entre o Natal e uma semana “normal” está entre os 10 e os 20%”.

O comunicado da Universidade do Indiana salienta que as pesquisas de análise sentimental nas publicações no Twitter revelaram que existem alturas do ano em que as pessoas parecem partilhar um sentimento de felicidade, calma e segurança. E que, nessas alturas, o interesse online em sexo também aumenta. Curiosamente, este efeito não terá sido confirmado na época do Dia de Ação de Graças (que se celebra nos EUA na ultima quinta-feira de novembro) nem na Páscoa.

Este lado fértil das celebrações – ou “disposição para amar”, como refere o comunicado – foi observado em duas culturas diferentes, com picos no Natal, na maioria dos países cristãos, e no Id al-Fitr (que marca o fim do jejum do Ramadão) na maioria dos países muçulmanos. O caso da celebração muçulmana é ainda mais significativo, uma vez que não ocorre na mesma data todos os anos e percebeu-se que o

efeito acompanha as variações de data, confirmando um padrão cultural.

Assim, os investigadores “viram que estes padrões cíclicos eram mais semelhantes entre países que partilhavam a mesma tradição cultural do que entre países com a mesma localização geográfica”, nota o comunicado do IGC, adiantando que “países como a Austrália ou o Brasil tinham padrões semelhantes quando comparados com países do hemisfério Norte como Portugal, Alemanha ou EUA”.

Os excessos do fim do ano?

Por outro lado, notam ainda, os padrões da Turquia ou do Egipto diferem de outros países do hemisfério Norte, mas têm um comportamento online semelhante à Indonésia, um país muçulmano do hemisfério Sul. Em resumo, é a cultura (ou as festas, se preferirem) que importa e não a geografia. “Os nossos resultados sugerem que os ciclos de reprodução humana dependem do estado de espírito coletivo das sociedades. O Natal e o Id al-Fitr são feriados religiosos orientados para a família, que geram nas pessoas um estado de espírito mais feliz e calmo, o que provavelmente resulta num maior interesse por sexo”, diz Joana Gonçalves Sá.

No comunicado da universidade norte-americana, Luís Rocha avança com uma hipótese muito semelhante, mas ligeiramente mais concreta: “Talvez as pessoas sintam uma maior motivação para aumentar a família durante estes feriados quando a ênfase é colocada no amor e presentes para crianças. A época do Natal também está associada a histórias sobre o menino Jesus e a sagrada família, que poderá colocar as pessoas num espírito mais amoroso, feliz e familiar.”

Apesar das possíveis explicações mais dirigidas para o espírito da época, não será também de desprezar o facto de esta ser uma altura que comprovadamente está associada a outro tipo de excessos, nomeadamente, no consumo de bebidas

alcoólicas e que também poderá contribuir para uma disposição mais… “amorosa”. E se o Natal não servir de desculpa, na semana seguinte, surge a festa de passagem de ano. Sendo certo que as crianças concebidas nessa altura também podem nascer ainda em setembro.

Luís Rocha admite que o estudo “não consegue separar muito bem a influência do Natal e do fim do Ano por estarem tão próximos”, até porque, nota, as “pesquisas semanais que usamos, em alguns anos incluem as pesquisas do Ano Novo”. Porém, o investigador separa as águas entre culturas: é que se podemos considerar o Natal e Ano Novo como inseparáveis nos países cristãos, é preciso ressalvar que em países muçulmanos a celebração do Id al-Fitr “não está de todo ligado aos excessos do fim do ano no Ocidente e temos o mesmo fenómeno”.

Assim, seja porque os dias são mais curtos e frios, seja pelos festejos mais ou menos “regados”, seja pela fruição de um espírito mais feliz e calmo nesta altura do ano, o facto é que esta investigação mostra que o interesse por sexo aumenta nesta época. E que tem consequências nas estatísticas, nove meses mais tarde.

 

Segundo a Dr.ª Maria do Céu Santo…

A ginecologista, obstetra e coordenadora de Medicina Sexual da Sociedade Portuguesa de Sexologia, Maria do Céu Santo, não nota, na prática clínica, grande variação no número de nascimentos. Reconhece, porém, que “em matéria de planeamento familiar, há mais disponibilidade para falar sobre esta matéria em junho, antes das férias, e em dezembro, antes do fim do ano. Creio que as pessoas, com relações mais estáveis, estão mais disponíveis porque acham que vão estar mais em família, vão ter mais sexualidade, vida afetiva e vão ter mais tempo”.

No entanto, esta especialista considera que a quadra natalícia é mais inibidora da sexualidade do que o réveillon. “Mais do que o sexo no Natal, creio que a ocasião mais comum é o ano novo.” E porquê? “Porque o primeiro é mais familiar, as pessoas estão geralmente mais atarefadas e há mais conflitos, temos de conciliar os pais, os sogros, por vezes segundas famílias e isso cria maior tensão”, refere. Mas há ainda um outro factor que promove o arrefecimento da vida a dois por altura do Natal. “Muitas vezes as famílias vão para casa dos pais ou dos sogros e, como as casas não são muito grandes, os filhos ficam a dormir no quarto da mãe e do pai, colocando a sensualidade e a sexualidade num segundo plano”.

Já no Ano Novo, a coordenadora de Medicina Sexual da Sociedade Portuguesa de Sexologia diz que tudo é diferente. “Aí é ao contrário. Geralmente, é uma fase em que as pessoas investem mais nos amigos, muitas vezes conhecem pessoas novas, iniciam novos relacionamentos e têm mais tendência para a sedução e imagem.”

É possível mudar o stresse do Natal?

Maria do Céu Santo tem dúvidas: “É difícil!”. “As pessoas estão numa correria, vivem naquilo a que tenho chamado a disfunção de vida e é complicado superar essas questões”, justifica. Por isso, uma semana depois da festa da família chega um outro período para o romance e o amor. “A passagem do ano é um espaço aberto ao namoro, à sedução, ao investimento em nós próprios, o Natal é o conceito de família com tudo de bom e de mau que isso implica”, vinca a especialista.

Maria Filomena Mendes também entende o Ano Novo como uma fase que pode ser interessante em matéria de fecundidade e demografia. “Só o facto de as pessoas estarem mais relaxadas e bem consigo próprias pode ter um efeito positivo. Mas falamos de uma constatação de facto de que há mais nascimentos em setembro, significando uma maior taxa de fecundidade no final do ano, uma fase em que paira a expetativa num futuro melhor, com mais rendimento, talvez com mais emprego e que pode condicionar a decisão, creio que é uma época em que as pessoas acreditam mais no que está por chegar”.

O pico dos divórcios

É nos meses de março e agosto que se regista um aumento do número de divórcios, segundo um estudo da Universidade de Washington, nos EUA. A culpa é, na maioria dos casos, das férias familiares.

O mês de março não costuma ser um dos preferidos das famílias para marcar férias, mas os investigadores têm uma explicação para este fenómeno. A entrada num novo ano é de expectativa e otimismo, altura em que os casais ainda depositam alguma esperança na salvação do casamento. No entanto, por volta desse mês, veem que nada mudou e a frustração regressa, optando pelo divórcio.

O Natal e a Passagem de Ano são, por sua vez, as épocas em que se registam menos divórcios. Por volta destas datas, em que se dá especial atenção à família, o divórcio acaba por tornar-se um tema tabu, até quando já todos sabem que o casamento não tem solução.