Dor menstrual intensa e incapacitante, desconforto na bexiga ou dor nas relações sexuais são os principais sintomas da endometriose, uma doença ginecológica de natureza progressiva, e sem cura, considerada uma das maiores causas da infertilidade feminina.
De causa desconhecida, embora se admita que fatores genéticos, hormonais, imunológicos ou ambientais possam estar na sua origem, a Endometriose é uma condição clínica crónica que atinge cerca de 10% das mulheres em idade reprodutiva. E, apesar de se estimar que em 80% dos casos o principal sintoma é a dor intensa, esta patologia pode ser assintomática. Para nos explicar, convidámos a médica ginecologista Irina Ramilo.
O que é?
A endometriose é uma doença crónica, benigna, que se caracteriza pelo crescimento de tecido endometrial (glândulas e estroma) fora do seu local habitual que é a cavidade uterina, por exemplo no peritoneu pélvico, nos ovários, na bexiga, no apêndice, intestinos ou, até, no diafragma.
Para além destas formas de endometriose que se manifestam na cavidade abdominal, a endometriose pode, embora mais raramente, afetar órgãos mais distantes, como o pulmão, o nariz ou a pele.
A prevalência da endometriose é de cerca de 10% da população em idade reprodutiva. Nas mulheres com infertilidade, essa prevalência aumenta para cerca de 25 a 45%.
Quais são as causas da endometriose?
A origem da endometriose ainda não é plenamente conhecida e é, por isso, motivo de controvérsia. A menstruação retrógrada através das trompas, fenómeno normal em muitas mulheres, pode facilitar a implantação de tecido do endométrio na zona pélvica e, por isso, é um dos mecanismos aceites para o desenvolvimento da endometriose.
Por outro lado, admite-se também como possível a influência de fatores genéticos, hormonais (níveis elevados de estrogénios), raciais (risco mais elevado na mulher caucasiana), ambientais (substâncias tóxicas, como as dioxinas) ou sociais (stress).
Como se manifesta?
De um modo geral, a endometriose provoca o aparecimento de sintomas, sendo que em 80% dos casos a dor é a principal manifestação da doença. Em 20% dos casos, a endometriose associa-se a infertilidade podendo também ser, embora mais raramente, assintomática.
A dor da endometriose é muito incapacitante e tem um forte impacto nos diversos aspetos da vida da mulher. A sua forma de apresentação é muito variável e depende da gravidade da doença e da localização dos focos de endometriose. Essa dor pode surgir associada à menstruação e, inicialmente, cede ao tratamento com anti-inflamatórios ou com a pílula. À medida que se torna mais intensa deixa de responder ao tratamento. Noutros casos, a dor manifesta-se durante as relações sexuais (dispareunia).
Como se referiu, em função da localização da endometriose, a dor será distinta: pode ocorrer na região pélvica ou pode surgir sob a forma de cólicas intestinais, sobretudo durante a menstruação, associando-se a diarreia ou, mais raramente, obstipação. Se a endometriose afetar a bexiga, a dor surge durante a micção, podendo ocorrer perda de sangue na urina (hematúria). As hemorragias retais (retorragias) ocorrem quando a endometriose invade a mucosa retal. Se ela estiver presente nos ureteres, pode ocorrer falência irreversível da função renal. Para lá da dor, muitas mulheres referem menstruações abundantes.
É importante salientar que a endometriose, quando não diagnosticada e tratada, tem tendência a progredir, invadindo outros tecidos. Por outro lado, parece existir uma correlação entre a endometriose e o carcinoma de células claras do ovário, o que reforça ainda mais a necessidade de um diagnóstico e tratamento precoces. A infertilidade é outras das manifestações da endometriose e resulta da invasão e oclusão das trompas pelo tecido endometrial.
Como se diagnostica?
A história clínica e o exame médico são importantes no diagnóstico da endometriose mas, na ausência de endometriomas (lesões localizadas de endometriose), são poucos os métodos de diagnóstico não invasivos capazes de detetar a doença. Desses, a ecografia e a ressonância magnética são os mais eficazes.
Consoante as queixas e a localização da endometriose, pode ser necessário efetuar uma cistoscopia, rectosigmoidoscopia, um clister opaco ou uma tomografia computorizada.
Contudo, o método ideal, quer para o diagnóstico quer para o tratamento da doença, é a laparoscopia. Só através desta técnica se consegue obter um diagnóstico completo.
“Existem vários tipos de endometriose”, esclarece a especialista que a classifica enquanto “endometriose superficial ou peritoneal, caracterizada por lesões disseminadas na superfície (peritoneu) do interior do abdómen, podendo atingir o diafragma”, endometriose ovárica com implantes na face externa dos ovários que conduz à
formação de quistos (também designados por endometriomas) e endometriose infiltrativa profunda.
Sendo que nesta última, “em que os implantes alcançam uma profundidade superior a 5 milímetros”, a doença pode envolver o septo recto-vaginal e espaço vesico-uterino, “atingindo órgãos pélvicos como o recto, vagina, cólon sigmoide, uréteres, bexiga e nervos superficiais e profundos”. Órgãos mais distantes como o apêndice, diafragma e pulmão, também podem vir a ser afetados.
Como se trata a endometriose?
Não sendo possível curar a endometriose, o tratamento deve ser orientado para o alívio da dor e dos outros sintomas, aumentar as possibilidades de gravidez e reduzir os focos de endometriose.
O tratamento cirúrgico consiste na remoção dos focos de endometriose por laparoscopia. Sempre que possível, tenta-se eliminar apenas esses focos. Se tal não for viável, como sucede nas formas mais extensas, a cirurgia implicará a excisão dos órgãos pélvicos afetados.
Em alguns casos, é possível recorrer ao tratamento por laparoscopia, com laser. No que se refere ao tratamento médico, ele consiste no controlo da dor, mediante a utilização de analgésicos, anti-inflamatórios ou terapêutica hormonal.
Nos casos de infertilidade em que a paciente deseje engravidar, a fertilização in vitro é o método mais eficaz.
Como se previne?
Não é possível prevenir o desenvolvimento de endometriose, mas essa possibilidade pode ser diminuída através de uma redução dos níveis de estrogénios no organismo.
Nesse sentido, é importante escolher o método de contraceção mais adequado a cada mulher, praticar exercício físico regularmente, de modo a reduzir a massa gorda (fonte de estrogénios) e evitar o consumo excessivo de álcool e de cafeína.