Poder Soul

23 – 27 Novembro

Willi J & Co. – Boogie with your baby (ki Ki) 1976 (23 de Novembro)

A meio dos anos 70, numa altura em que a cena Northern Soul gozava duma imensa vitalidade, dá-se uma ruptura entre os seus dois grandes motores: o Wigan Casino, comandado por Richard Searling, e a Blackpool Mecca, liderada por Ian Levine.

A cisão dá-se porque Ian Levine decide começar a incorporar nos seus sets, os sons da America negra contemporânea, pondo em causa as amarras que o movimento tinha à Soul exclusivamente gravada durante os 60, tendo na raridade o seu único critério diferenciador, o que lhe custou uma reacção violenta da facção mais ortodoxa deste marcante fenómeno da cultura de clubes britânica.

“Boogie with your baby”, um sete polegadas gravado pelos misteriosos Willi J. & Co., em Uniontown, no Alabama, e editado pelo selo local Ki Ki, terá sido uma das canções que passou a incorporar o lado mais contemporâneo da Mecca, que começou a ter pontos de contacto com os clubes Disco que começavam a dominar os Estados Unidos.

Apesar de ter tudo para se tornar num sucesso das pistas Disco do outro lado do Atlântico, a começar por uma linha de baixo completamente demolidora, esta canção que anuncia já o advento do Boogie, acabou por ser apenas uma das bandeiras de Ian Levine.

A versão instrumental, que aqui vos apresento, foi repescada por Keb Darge como um dos temas essenciais da cena Deep Funk, que iniciou a meio dos anos 90.

Willi J & Co

Mary Love – Born to live with heartache (Elco) 1971  (24 de Novembro)

Mary Love, cantora Soul que esteve activa entre a segunda metade dos anos 60 e o fim dos anos 70, antes de iniciar uma incursão no Gospel, com o seu marido, como Mary Love-Comer, deixou-nos uma mão cheia de canções marcantes, embora nunca tivesse gravado um álbum.

Entre 1965 e 1979 editou um número considerável de sete polegadas para editoras como a Modern e de doze polegadas para a T.K. Disco.

“Born to live with heartache”, editada em 1971 pelo pequeníssimo selo de Sacramento, na Califórnia, Elco, é uma canção com um peso e uma intensidade a que ninguém consegue ficar indiferente, onde Mary Love tem uma prestação simplesmente arrebatadora que, infelizmente, caiu no esquecimento.

A canção ganhou uma segunda vida quando Ian Wright a incluiu no primeiro volume das decisivas compilações “Sister Funk”.

Mary Love

Dorothy Williams – Watchdog (Volt) 1964  (25 de Novembro)

Apesar de ter gravado dois singles para duas editoras com alcance nacional – este “Watchdog”, para a Volt, subsidiária dum império de Memphis chamado Stax, e “The well’s gone dry” para a Goldwax – Dorothy Williams permanece um mistério até aos dias de hoje.

A sua carreira discográfica resume-se a este dois lançamentos, um de 1964 e o outro de 65, antes de, estranhamente, se evaporar completamente.

De facto estamos a falar de duas canções marcantes que, enchem pistas até aos nossos dias.

“The well’s gone dry” é incontornável na cena Northern Soul e este “Watchdog” faz parte da discografia básica da emergente cena europeia de Rhythm & Blues.

Pela amostra, Dorothy Williams estaria destinada aos mais altos vôos…

Dorothy Williams II

Martha Bass – Since you’ve been born again (Checker) 1968  (26 de Novembro)

Mãe de Fontella Bass, artista Soul que viria a ter um êxito assinalável, Martha Bass dedicou a sua vida ao Gospel, fazendo parte, até 1960, da formação dos míticos Clara Ward Singers.

Na década de 60 assina um contrato com a Checker, selo paralelo da Chess de Chicago, e, entre 67 e 72, edita uma mão cheia de LPs.

“Since you’ve been born again” faz parte de “Rescue me”, o seu melhor e mais raro álbum, e é um espantoso cruzamento entre Gospel e Funk, que mostra a plenitude do poder vocal de Martha Bass.

Numa altura em que as contaminações do Gospel na Soul, no Funk, no Disco e no Boogie, são um dos alvos preferidos dos Diggers e DJs especializados, um pouco por todo o mundo, esta canção frenética, que foi recuperada pela Soul Jazz, torna-se mais pertinente do que nunca.

Martha Bass III

Aaron Neville – Hercules (Mercury) 1973  (27 de Novembro)

Dificilmente trarei ao Poder Soul artistas com a carreira e o sucesso de Aaron Neville.

Nascido em 1941, o mais velho dos Neville Brothers, de New Orleans, é senhor duma impressionante carreira, que dura até aos dias de hoje, e, se juntarmos a sua actividade de artista, músico, compositor e produtor, colecionou, ao longo de quase quatro décadas, prémios e presenças nos Tops.

Com “Hercules”, editado em 73 pela Mercury, o caso terá sido outro.

Esta extraordinária canção passou completamente despercebida quando saiu e, só no inicio dos anos noventa, à custa da recuperação de que foi alvo pelos DJs de Rare Groove e Acid Jazz e do facto de ter sido samplada pelo rapper Young MC, lhe viu ser feita justiça.

Pessoalmente considero-a o melhor momento da carreira de Aaron Neville e só peca por ter estado muito à frente do seu tempo.

Aaron Neville