• Poder Soul

    8 junho 2020 – 12 junho 2020

    Segunda-feira

    Desmond Dekker + The Aces

    Israelites

    Pyramid

    Semana dedicada à memória do meu querido amigo Vicente Abreu, um dos 7 Magníficos, que acabou de nos deixar: primeiro com uma canção que disputávamos nas nossas festas, depois com dois artistas que eram a sua cara chapada e, finalmente, com duas canções que lhe quero “oferecer”.

    Compositor, músico e cantor, Demond Dekker nasceu em Saint Andrew, na Jamaica, em 1941, para vir a ser uma das mais populares figuras da fervilhante cena músical daquela marcante ilha.

    Cresceu em Kingston, foi aprendiz de alfaiate e soldador, antes de decidir pôr à prova os seus dotes vocais, primeiro em audições no Studio One e na Treasure Isle, que não resultaram em nada e, logo depois, na Beverley’s, onde Leslie Kong lhe propôs um contrato, em 61, tendo, a reboque, assegurado a contratação de Bob Marley, um colega de trabalho em quem Dekker achava que se devia apostar.

    Entre 1962 e 2006, Desmond Dekker teve uma sólida e bem-sucedida carreira, contribuindo para a afirmação, nacional e internacional, do Ska, do Rocksteady e do Reggae, através da edição de um sem número de álbuns e singles, através de marcas como a Berveley, a Island, a Pyramid ou a Trojan, entre os quais se encontram alguns absolutos clássicos da música jamaicana.

    Gravado em 68, para a Pyramid, na companhia dos Aces – “Israelites” – não só foi o seu primeiro grande hit internacional, como, muito provavelmente, o seu mais genial momento, ao ponto de ter sido regravado mais um par de vezes, na década e meia que se seguiu.

    Um explosiva canção Ska, fortemente influenciada pelos Rhythm + Blues e pela Soul, que rebenta com qualquer pista de dança e deve constar em qualquer coleção de música negra.

     

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    8 junho 2020 – 12 junho 2020

    Terça-feira

    Ann Peebles

    Trouble, heartaches and sadness

    Hi

    Nascida em East St. Louis, no Illinois, em 1947, Ann Peebles foi uma das mais carismáticas vozes da chamada Memphis Soul e, em particular, do importante catálogo da Hi Recordings.

    Filha de um Pastor e de uma cantora, começou a seguir as pisadas da mãe muito cedo, primeiro no coro da Igreja dirigida pelo pai e, depois, no seio do Peebles Choir, grupo familiar, fundado pelo seu avô bastante antes do seu nascimento, que fazia o circuito Gospel local.

    Começou a actuar nos clubes de St. Louis, na companhia do pai, ainda teenager, e, em 1968, teve a oportunidade da sua vida quando, durante uma viagem a Memphis, partilhou o palco com Gene “Bowlegs” Miller. 

    Impressionado com o seu talento, o trompetista, que tinha acabado de assinar com a Hi, apresentou-a a Willie Mitchell que a contratou na hora, abrindo caminho para um rico persurso discográfico que, entre 1969 e 2006, se reflectiu da edição de uma dúzia de consistentes Lps e cerca de duas dezenas e meias de singles que, essencialmente, na primeira metade dos 70, iriam marcar a Soul para sempre, a exemplo do que aconteceu com os seus companheiros de editora Al Green, Syl Johnson ou O.V. Wright, entre outros.

    Gravado em 71, como parte de “Straight from the heart”, o seu segundo Lp, mas também prensado em sete-polegadas – “Trouble, heartaches and sadness” – é um dos grandes temas que nos deixou e um dos favoritos do Vicente e deste vosso anfitrião.

    Uma profunda e poderosa balada Soul, com uns arranjos e uma produção só ao alcance de um génio como Willie Mitchell e uma interpretação superlativa, que já serviu de base para enormes canções de GZA, RZA e Raekwon, todos membros dos Wu-Tang Clan e, mais recentemente, do desconcertante Earl Sweatshirt.

     

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    8 junho 2020 – 12 junho 2020

    Quarta-feira

    Wee

    Try me

    Owl

    O imenso talento de Norman Whiteside, expresso na reduzida discografia dos seus Wee, mas não só, não teria o reconhecimento que tem, se o seu trabalho não tivesse sido recuperado, mais de trinta anos depois de ter sido gravado, pela Numero Group, uma editora que o Vicente colecionava religiosamente e cujos discos me cedeu, várias vezes, para que os pudesse partilhar aqui.

    Nativo de Columbus, no Ohio, começou cedo a tocar bateria, num trio familiar, ao mesmo tempo que aparava a relva do jardim de um tio, em troca de lições gratuítas de piano, o que lhe permitiu começar a escrever canções.

    Foi como compositor residente da decisiva Capsoul que Norman Whiteside começou, em 1972, o seu curto, mas profícuo, percurso artístico, deixando a sua marca em clássicos incontornáveis como “Can we try love again”, dos Kool Blues.

    Em 75, depois de deixar a Capsoul e de formar os Wee, Tom Murphy, um dos fundadores da pequena independente Owl, decidiu apostar nele, dando-lhe todo o tempo que necessitasse no seu estúdio para, nos dois anos que se seguiram, gravar três grandes singles e um ultra-colecionável Lp, que tiveram um relativo impacto local, mas que nunca conseguiram ter alcance nacional.

    Apesar de ainda ter escrito canções que ficaram, para gente como os I.R.S. ou Norma Jean, Norman Whiteside acabou por trocar a música por uma vida ligada ao pequeno crime e, em 85, foi condenado a trinta e um anos de prisão, por, supostamente, ter vendido a arma que serviu para atingir mortalmente Laura Carter, durante um tiroteo em que foi apanhada pelo fogo cruzado, algo que sempre negou.

    Foi da prisão que viu a sua obra ser recuperada, reconhecida e samplada por nomes como Jay Electronica, Kanye West ou Frank Ocean, e vir a ter um alcance que achava não ser possível.

    “Try me” foi prensada em sete-polegadas, em 76, pela Owl, e, no ano seguinte, incluída, na sua versão longa, no alinhamento de “You can fly on my aeroplane”, o mítico álbum dos Wee.

    Uma verdadeira obra-prima Modern Soul midtempo, que se transformou num Graal da cena especializada e que retrata na perfeição o talento ímpar de um pequeno génio, para quem a vida foi ingrata, mas que, chegou a ser confundido com Sly Stone, tal era o seu carisma.

     

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    8 junho 2020 – 12 junho 2020

    Quinta-feira

    Freda Payne

    We’ve got find a way back to love

    Invictus

    Freda Payne nasceu em Detroit, no Michigan, em 1942, para ter uma longa e bem-sucedida carreira, que mantem até aos nossos dias.

    Cresceu a ouvir icons do Jazz, como Billie Holiday ou Ella Fitzgerald e frequentou o Detroit Institute of Musical Arts, participando na gravação de jingles de rádio e concursos de talento, até se mudar para Nova Iorque, no princípio dos anos 60 e iniciar o seu rico percurso, participando em prestigiados programas televisivos, como o Tonight Show de Johnny Carson ou o Merv Griffin Show, acompanhando Billy Eckstine ou os Four Tops numa tour de Quincy Jones e gravando o seu primeiro Lp, para a Impulse!, em 63, depois de editado um trio de singles, através da His Master’s Voice e da Abc-Paramount.

    Em 69, Freda Payne reencontrou os seus conterrâneos e amigos Brian e Edward Holland e Lamont Dozier, que a recrutaram para a sua recém-formada Invictus Records, dando início à fase mais produtiva e de maior êxito da sua carreira que, até ao presente, se reflectiu na edição de perto de duas dezenas de álbuns e um sem numero de singles, que fizeram dela uma referência da Soul, mas também do Jazz.

    Gravado em 1973, como parte do Lp “Reaching out”, e, também, editado em single, pela Invictus – “We’ve got to find a way back to love” – é, na minha opinião, o seu momento supremo e, sem qualquer dúvida, aquele que levava o Vicente aos píncaros.

    Uma imensa canção, escrita por Holland-Dozier-Holland, com uma produção imaculada deste crucial trio, que está entre a melhor Soul registada na década de 70, foi samplada pelos incontornáveis A Tribe Called Quest e é obrigatória em qualquer coleção que se preze.

     

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    8 junho 2020 – 12 junho 2020

    Sexta-feira

    Funk Inc.

    Where are we going

    Prestige

    Em 1969, o organista Bobby Watley juntou-se ao guitarrista Steve Weakley, ao saxofonista Eugene Barr, ao baterista Jimmy Munford e ao percussionista, especializado nas Congas, Cecil Hunt, para formar os Funk Inc., em Indianapolis, no Indiana.

    Nascido em Chattanooga, Tennessee, e criado em Steubenville, no Ohio, Watley, tinha iniciado o seu percurso profissional como baterista da house-band de um clube de Cleveland, onde acompanhou nomes como Etta James, Major Lance, Big Maybelle, Ben E. King ou os Coasters, mas uma passagem pela banda de Lonnie Smith fez com que se apaixonasse pelo orgão, instrumento que viria a adoptar com o apoio de Jack McDuff, o seu tutor e o elo de ligação dos Funk Inc. a Bob Porter que, em 70, os contratou para a Prestige, dando o pontapé de saída para uma carreira que, entre 71 e 74, nos deu uma mão cheia de grandes Lps, para além de um número apreciável de sete-polegadas.

    São muitos os clássicos assinados por esta banda que se tornou numa das bandeiras das cenas Rare Groove e Acid Jazz, mas a sua extraordinária versão do original de Larry Mizell e Edward Gordon, imortalizado por Marvin Gaye – “Where are we going” – gravada para “Priced to sell”, o derradeiro Lp da sua primeira e principal encarnação, é aquele que não me larga, neste momento em que sou forçado a despedir-me de um dos meus melhores amigos.

    Um momento de puro génio, com uma produção e uns arranjos do outro mundo, assinados por David Axelrod, que eu gostaria que fosse a homenagem emocionada do Poder Soul ao meu amigo Vicente Pinto de Abreu.

     

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