Poder Soul

4 – 8 de Janeiro

Pedro Tenreiro desenterra os tesouros perdidos da idade do ouro da música negra, de segunda a sexta-feira, pelas 16h20, na Antena 3.

 

Cold Blood – I’m a good woman (San Francisco) 1970 (4 de Janeiro)

Foram várias as grandes versões que esta imensa canção escrita e gravada originalmente por Barbara Lynn, em 1966, teve.

Para além do maravilhoso original, Cold Blood, The Generation, Silky Spearman, El Chicano e, mais recentemente, Gizzelle e Hannah Williams + The Tastemakers, foram responsáveis por boas versões de “I’m a good woman”.

A versão do colectivo de San Francisco, editada em 1970 e cantada por Lydia Pense, que também deu voz ao take dos Generation, será a mais uptempo e “club friendly”. O peso e a expectativa da intro mantém-se ao nível do original, mas a canção dispara com uma força e um Groove completamente irresistíveis e, por muito que não tenha a alma que apenas Barbara Lynn lhe consegue emprestar, destrói qualquer pista de dança.

Cold Blood

The Millionaires – Never for me (Philips) 1967 (5 de Janeiro)

Embora não seja um daqueles discos incomportáveis que fazem a história do Northern Soul, “Never for me” é, das canções que melhor caracterizam o movimento, uma das minhas favoritas.

De resto, obedece a quase tudo o que é imagem de marca dos hinos do género.

É dum grupo de L.A. com uma carreira fugaz e um pequeno número de singles. Foi editado pela Philips em 1967 sem o sucesso desejado e destinado ao esquecimento, não fosse o fanatismo dos ingleses do Norte. E replica na perfeição as grandes canções da Motown que tanto influenciaram a Soul dos 60, superando, na minha opinião, muito do que sustentou o império de Detroit.

The Millionaires

The Supremes – Those DJ shows (Motown) 196? (6 de Janeiro)

A indústria discográfica está cheia de mistérios insondáveis, de escolhas incompreensíveis.

“Those DJ shows” das Supremes é um desses casos.

Registada nas sessões de gravação do álbum de estreia do grupo bandeira da Motown, esta canção, absolutamente irresistível, viria a ficar de fora do alinhamento do Lp.

A explicação é um mistério – Berry Gordy não lhe reconheceu o potencial; a gestão de egos, nomeadamente entre Florence Ballard e Diana Ross, que lhe dá corpo e mais tarde se iria transformar na líder do grupo, obrigou-o a fazer opções? Quem sabe?

Certo é que, para além duma edição pirata em single dos anos 90, “These DJ shows” apenas existe em vinil, numa edição alemã de 87, que comemora os 25 anos da banda e nas edições especiais da re-edição de “Meet The Supremes” em CD.

Vá-se lá saber porquê…

The Supremes

Charles Spurling – Let me be (a steppin’ soul) (King) 1968 (7 de Janeiro)

Oriundo de Cincinnati, Charles Spurling fez parte do grupo de “protegidos” de James Brown, tendo, no fim dos anos 60, editado alguns sete-polegadas, numa altura em que o Godfather of Soul fez de A&R da King.

Curiosamente a relação próxima que mantiveram durante uma meia dúzia de anos teve uma origem algo violenta.

Spurling que, tal como Brown, tinha sido boxeur amador, espancou os Famous Flames, a banda do padrinho, num quarto de Hotel quando estes se recusaram a pagar-lhe os temas que havia composto para Hank Ballard. Quando James Brown o confrontou acerca do sucedido e o tentou agredir, algo a que estava habituado, acabou estendido, reconhecendo-lhe, mais tarde, qualidades para lhe entregar as tarefas de A&R, o que o fez deixar a sua carreira artística para segundo plano.

Ainda assim, Charles Spurling co-escreveu o clássico de Marva Whitney, “Unwind yourself”, e editou esta bomba “Let me be (a steppin’ stone)”, que se viria a tornar num dos mais raros e apetecidos trunfos da King, na cena Deep Funk.

Charles Spurling

 Otis Lee – Hard row to hoe (Quaint) 196? (8 de Janeiro)

É mesmo muito pouco aquilo que se sabe sobre Otis Lee, os seus dois únicos singles e o selo pelo qual saíram, a Quaint Records.

“Hard row to hoe” chega à cena Soul britânica nos anos 80, aparentemente pelas mãos de Pat Brady, que terá descoberto uma caixa de 50 cópias, e que o passava como um “cover-up” sob o nome de Lee Blackmore and The Soul Searchers, não tendo, nessa altura, suscitado a atenção que merecia.

No entanto, o seu invulgar cruzamento do sofrimento Blues, do back-beat Funk e da melodia Soul, viria a reservar-lhe o estatuto de Santo Graal da cena Rhythm’n’Soul, que explodiu já neste século e, actualmente, as poucas cópias que circulam por aí trocam de mãos sempre perto de valores com 4 algarismos.

Otis Lee