63 anos. Velho solitário de poucas palavras que tem uma loja de antiguidades na cidade há 32 anos e é conhecido como “o velho da enxada” por ser visto muitas vezes com uma enxada a caminho da mata. Os vizinhos não conhecem com detalhe o seu passado e acham que ele é apenas um louco que acumula, na loja e na oficina anexa, os objetos que os outros querem deitar para o lixo. Sabem que tem um filho com cerca de 40 anos, mas viram-no poucas vezes porque vive noutra cidade e raramente visita o pai. Os únicos clientes da loja são alguns desconhecidos que vêm à procura de raridades da cultura pop dos anos 60, 70 e 80 (em grande parte ainda por estrear) que ele foi comprando como terapia para “afugentar os fantasmas da solidão”. Trata cada vinil, par de ténis Adidas, móvel ou pequeno eletrodoméstico da loja, como marcas da história que quer preservar e guardar. Vive “agarrado” ao passado. A loja era um projeto da mulher que só conseguiram concretizar alguns anos depois de terem deixando a aldeia dos pais com o filho ainda muito pequeno. Na cidade, enquanto não conseguiram juntar dinheiro para abrir o negócio, ele trabalhou como mecânico e ela nas limpezas. A mulher morreu há 22 anos. Agora, apesar de quase não ter clientes, não quer fechar a loja e a oficina. Sobrevive com a baixa reforma que recebe do trabalho como mecânico. Na cidade, todos o veem como um louco solitário. Os pais ameaçam os filhos que se portam mal dizendo que o “velho da enxada vem aí”.