Oub'lá

Sean Riley & The Slowriders

Foto: Pedro Pina

 

“Retiramos muitas coisas boas de sermos amigos e de podermos estar juntos”

 

Quando conversámos com Afonso Rodrigues, vocalista dos Sean Riley & The Slowriders, sobre o concerto deste sábado no Centro Cultural de Belém, a propósito do ciclo CCBeat, ainda não era altura de anunciar que Mazgani iria ser um convidado especial para subir ao palco. Esse anúncio só apareceu ontem na página de Facebook da banda, numa altura em que os bilhetes para o espetáculo estão praticamente esgotados.

O concerto de amanhã promete ser muito especial: é o primeiro da banda em Lisboa desde há muitos meses e um dos primeiros em sala desde o lançamento do quarto disco de originais. O verão foi passado em recolhimento e luto após o desaparecimento do baixista Bruno Pedro Simões. Aos poucos, os Slowriders vão-se recompondo. Afonso confessa que não se trata de “ultrapassar”, mas antes continuar a viver. A noite de amahã no CCBeat – com um passeio pelos dez anos de discos, desde Farewell, passando por Only Time Will Tell, It’s Been A Long Night até ao mais recente disco homónimo, promete ser mais um passo nesse prosseguimento dos Slowriders: uma noite de muita música entre amigos e família para rir, para chorar, para recordar e para abraçar.

Normalmente, os concertos do ciclo CCBeat tendem a ser propostas para as bandas se recriarem e terem uma liberdade um bocadinho maior do que aquela que costumam ter nos concertos das digressões. Para este concerto no CCB, o que é que estão a preparar?

Vai ser diferente desde logo porque não fizemos muitos concertos em sala – praticamente nenhuns. No ano passado fizemos promoção ao álbum quando saiu, mas basicamente em grandes eventos: festivais e palcos grandes e ao ar livre. Por isso ainda não explorámos muito este tipo de concerto em sala. Com certeza que a nível de alinhamento vamos também optar por canções que ainda não temos tocado tanto. Vai haver algumas surpresas: uma ou outra em coisa que não fizemos ao vivo, mas também vamos ter também um convidado especial [Mazgani, soube-se ontem]. Na prática, se somares tudo isso, vais ter uma data de coisas diferentes de um concerto normal de Slowriders.

 

“Se não tivéssemos a relação que temos uns com os outros isto seria impossível. Se não fosse o Nuno Filipe [baixista] também a estar neste momento a tocar novamente connosco isto também não seria possível”

 

Como tem sido a preparação e a escolha do alinhamento? Muito focado no vosso último disco?

Diria que vai ser, eventualmente, 40 por cento do último álbum e 60 por cento a dividir pelos três álbuns anteriores. Claro que queremos cantar as canções novas, e por norma estás sempre mais entusiasmado com as coisas que fizeste há menos tempo, mas por outro lado também queremos ir aos outros discos e recuperar canções de que também gostamos e que sabemos que, normalmente, as pessoas também gostam de ouvir. Eventualmente buscar até uma ou outra coisa um bocadinho menos óbvia do passado.

Mais uma ou outra cover, eventualmente?

Acho que sim, também há-de passar por aí um. Também não queria estar a passar muita informação sobre aquilo que vai ser para poder ser novidade e surpresa para quem for ao Centro Cultural de Belém. Mas sim: será por aí.

 

“Sabendo que nenhum dos desfechos iria ser muito positivo – acabar ou continuar a banda – pelo menos o continuar a tocar iria permitir que continuássemos a partilhar coisas boas”

 

Como disseste, neste último verão fizeram apenas alguns concertos pontuais. Como tem sido preparar este regresso ao trabalho depois do difícil período de luto pelo qual a banda passou?

De facto, não tocámos mais no ano passado porque não quisemos fazê-lo. Quisemos sim manter alguns compromissos que já tínhamos definidos e fazer os concertos de maior dimensão. Mas na prática a nossa decisão foi continuar a tocar: era uma coisa que importante para nós, que era isso que faria sentido, que era a única decisão que podíamos tocar. Nesta fase estamos a ensaiar e é sempre um pouco complicado, porque temos sempre um misto de sentimentos, porque há coisas que nos fazem sentir bem e há outras que nos trazem memórias que, se calhar, não são a forma mais positiva de ver as coisas, até porque acaba por aparecer alguma saudade e alguma tristeza. Mas na prática, aquilo que tocar faz por nós é extremamente bom e compensa largamente essa parte de ter de lidar com alguns sentimentos de tristeza e saudade. Vamos gerindo esse equilíbrio e vamos estando lá uns para os outros. Também retiramos muita coisa boa de sermos amigos e de podermos estar juntos. É ir andando dia a dia. Não gosto muito da palavra “ultrapassar” porque acho que há coisas que não se ultrapassam, mas continua-se a viver.

 

“Temos sempre um misto de sentimentos, porque há coisas que nos fazem sentir bem e há outras que nos trazem memórias que, se calhar, não são a forma mais positiva de ver as coisas, até porque acaba por aparecer alguma saudade e alguma tristeza”

 

A decisão de continuar com a banda prendeu-se muito com essa importância de poderem continuar juntos e ajudarem-se uns aos outros a prosseguir com as vossas vidas?

Sem dúvida. Se não tivéssemos a relação que temos uns com os outros isto seria impossível. Se não fosse o Nuno Filipe [baixista] também a estar neste momento a tocar novamente connosco isto também não seria possível, mas ele foi uma pessoa que esteve sempre ao lado da banda desde o início – como roadie, como road manager e baixista noutras alturas. Se não fosse ele, provavelmente também não iríamos encontrar outra pessoa com quem nos sentíssemos à vontade, porque também não íamos sentir que estava dentro da família. Mas é como te digo: sabendo que nenhum dos desfechos iria ser muito positivo – acabar ou continuar a banda – pelo menos o continuar a tocar iria permitir que continuássemos a partilhar coisas boas. Era sempre uma decisão melhor do que fechar as coisas numa nota que iria ser, para sempre, extremamente negativa.

Como é que tens visto a entrega do Nuno à banda nesta altura, o abraço às canções e à história dos Sean Riley & The Slowriders?

É algo simples de lidar porque ele sempre esteve ligado à banda. Relativamente às canções: cada um de nós tem a sua própria assinatura, tem a sua própria forma de fazer as coisas e até o próprio sentimento que coloca em cada nota que dá. Isso é irrepetível, porque cada um de nós tem uma assinatura muito própria a tocar. Mas o Nuno é extremamente bom naquilo que faz: integra perfeitamente as canções e cumpre sempre o propósito daquilo que nos propomos quando tocamos ao vivo.

 

“Também retiramos muitas coisas boas de sermos amigos e podermos estar juntos. É ir andando dia a dia. Não gosto muito da palavra “ultrapassar” porque acho que há coisas que não se ultrapassam, mas continua-se a viver”

Entrevista: Bruno Martins

Recorda a passagem dos Sean Riley & The Slowriders pelo No Ar