Oub'lá

Eleanor Friedberger

“Agora estou interessada em fazer algo mais caótico”

 

Os últimos anos de Eleanor Friedberger têm sido um corropio. Desde o hiato dos Fiery Furnaces, em 2011, que a norte-americana tem experienciado uma série de experiências sonoras que se traduziram em três discos: Last Summer (2011), Personal Record (2013) e o mais recente New View (2016). Este último trabalho nasceu de uma série de mudanças na vida de Eleanor, que deixou para trás quase década e meia de vida em Brooklyn, Nova Iorque, e a mudança para Hudson Valley, na parte rural do estado de Nova Iorque. Passou ainda pela Califórnia e agora, antes de voar até Portugal, assentou arraiais na Europa, onde mora em Atenas há cerca de um mês. É com o espírito de mudança, de encontrar novas influências, que Eleanor Friedberger atua sábado à noite no Musicbox – sozinha em palco, a tocar as canções que dão hoje mais sentido à sua vida.

Chegas a Portugal no sábado para um concerto no Musicbox. Imagino que tragas o teu novo disco, New View. Como tem sido a digressão destas novas canções?

Não é bem uma digressão. Tenho andado a fazer digressão desde que o disco saiu, na verdade. Chamo-lhe a “never ending tour” (risos). Mas os mais recentes concertos foram já na Europa: quis vir para Atenas, Grécia, por um mês. E então pedi ao meu agente para juntar mais alguns espetáculos para poder tocar aqui pela Europa.

Porque é que quiseste ir para a Grécia?

Para começar a fazer algumas escritas para o meu próximo disco, fazer concertos e ter aulas de grego. A minha mãe é greco-americana e então, nos últimos anos, tenho vindo para cá com alguma regularidade, sobretudo para férias. Mas queria passar mais tempo aqui, até para passar mais tempo longe de Nova Iorque, onde está muito frio e muita neve. Além de que Atenas é uma cidade muito barata nesta altura, ao contrário de Nova Iorque onde não conseguia arrendar um apartamento por um mês. Mas entretanto, aqui em Atenas juntei uma banda grega para tocar, porque estava com muito tempo.

É com essa banda que virás?

Não, em Lisboa será diferente. Vou estar a tocar sozinha.

 

“Escolhi o título New View seis meses antes de o álbum ser editado e na altura sentia-me muito otimista. Queria que isso se notasse no disco: é um álbum muito quente e devia soar a um disco positivo (risos). Mas agora, um ano depois, sinto exatamente o oposto”

 

E uma vez que já estás a trabalhar em canções novas, pode dizer-se que estás a começar a criar uma nova “New View”?

(risos) Exatamente. Sei que soa um bocadinho a foleiro, mas creio que é importante continuar a mudar de perspetiva para encontrar novas ideias. Este último mês tem sido muito bom: tenho sido introduzida a novas imagens, novos sons, pessoas, idiomas… tem sido muito interessante.

E é fácil conciliar esses novos pontos de vista e aprendizagens com a tua música?

Acho que sim. Sobretudo a língua grega: eu cresci a ouvir grego, por causa da minha família – mesmo que não perceba o que dizem. Tenho ido ouvir alguma música grega ao vivo, mas não é isso que interessa: é mais entregar-me a novas formas, a novos ambientes e ver o que acontece.

Quando escolheste o título do disco, New View, foi com uma perspetiva otimista ou é apenas a constatação de um facto?

É interessante, porque eu escolhi esse título seis meses antes do disco ser editado e na altura sentia-me muito otimista. Queria que isso se notasse no disco: o álbum é, todo ele, muito quente e devia soar a um disco positivo (risos). Mas agora, um ano depois, sinto exatamente o oposto. Mas sim, era para ser otimista: e espero que a mensagem ainda se faça sentir. Eu fiz algumas t-shirts que dizem “New View”, uma espécie de fotografia com a Terra vista do espaço.. Alguns amigos, em Atenas, quiseram comprá-la. Houve uma mulher que estava a mudar de apartamento, a passar por algumas mudanças na relação – e ficou muito feliz por ter aquela t-shirt, disse-me que era uma espécie de lembrete.

Essa mulher era um espelho daquilo que foi a tua vida quando começaste a escrever o disco? Sei que também mudaram muitas coisas na tua vida, incluindo uma mudança de casa e até de Estado.

Sim, fica a algumas horas de Nova Iorque para uma zona mais rural.

Foi essa mudança de Brooklyn para uma nova casa que te motivou a fazer um disco novo?

Eu escrevi as canções quando já estava na casa nova, mas já tinha algumas ideias. Tive uma ligeira crise, porque vivi no mesmo bairro durante 14 anos, onde aprendi a ser adulta. Aquele bairro de Nova Iorque moldou-me mesmo. E tinha medo que se saísse daquele ambiente – mesmo a viajar a toda a hora – não saberia o que fazer. Estava entusiasmada por mudar, mas com medo. Assim que saí, tornei-me mais feliz. 11:39

Esse medo da mudança é o que nos prende e agarra ao passado. Só quando mudamos é que percebemos isso.

Sei que nem todos podem deixar o trabalho assim de repente, mas concordo: é bom sair do espaço habitual.

 

“Quando estou a tocar sozinha, é quase como se estivesse a fazer stand-up comedy. Mas sem fazer as pessoas rir (risos) É um outro tipo de forma de arte. O público também é companhia, mas eu preciso de muita concentração para conseguir tocar sozinha”

 

Quando mudamos de uma casa para outra, temos de arrumar as nossas coisas em caixas. Foi o que fizeste com este New View? Pegaste em memórias velhas, histórias passadas, guardaste em caixas e arrumaste-as na arrecadação?

(risos) É uma boa forma de ver, sim! Mas acho que todas as minhas canções são todas assim. Agora estou num processo de colecionar coisas: para conseguir fazer canções tenho que juntar em caixas tudo o que estou a reunir. No fundo são as minhas experiências.

No último ano e meio foste de Brooklyn para Hudson Valley, depois para a Califórnia e agora Atenas. São muitas mudanças num só ano!

Sim. Em 2016 viajei mais do que alguma vez o tinha feito. Fui a tantos sítios: parece exaustivo, mas foi incrível.

Como é que achas que isso vai refletir-se nas canções que estás a fazer agora?

Agora estou mais interessada em fazer algo um bocadinho mais barulhento, caótico. E é assim que tem sido a minha vida. Até agora tenho escrito letras e depois componho música para elas, mas agora estou a tentar fazer o oposto: tenho escrito melodias no piano, feito peças instrumentais e espero por fazer músicas mais no fim.

Vai ser uma grande mudança?

Espero que soe diferente. Não estou a falar nada de radicalmente diferente, sobretudo na minha voz – que é o que dá uma certa personalidade aos meus discos.

Esta “digressão interminável” pela Europa tem-te dado novas perspectivas – “new views” – às músicas que já tinhas escrito?

Sem dúvida. Especialmente porque tenho tocado com muitos músicos, mas também a solo. Tenho de mexer nas músicas constantemente para que possam servir os músicos e a mim também. E isso é muito divertido, é algo que tenho feito ao longo dos anos, desde que tocava com o meu irmão [Matthew Friedberger] em Fiery Furnaces. A escrita de canções é uma coisa, gravá-las é outra e tocá-las ainda é outra coisa.

 

“O concerto vai ser muito básico: serei eu a cantar e a tocar guitarra, mas vou tocar canções mais velhas dos Fiery Furnaces, canções do meu disco a solo e algumas versões. São aquelas coisas que me dizem muito nesta altura”

 

E do que é que tu gostas mais?

Uma coisa é muito solitária, outra é mais precisa – como se fosse uma experiência científica – e tocar ao vivo tem tudo a ver com camaradagem.

Sentes-te sozinha em palco quando fazes um espetáculo como este de sábado no Musicbox, em que não há mais ninguém contigo em palco? Ou o público é sempre uma boa companhia?

É um bocadinho das duas coisas. Eu costumo dizer, meio na brincadeira, que, quando estou a tocar sozinha, é quase como se estivesse a fazer stand-up comedy. Mas sem fazer as pessoas rir (risos) É um outro tipo de forma de arte. O público também é companhia, mas eu preciso de muita concentração para conseguir tocar sozinha. Preciso de bloquear a existência do público até certo ponto. É uma estranha mistura de querer-me ligar com a plateia, mas também querer mantê-los longe.

Queres explicar-nos melhor o que é que vais fazer neste concerto do Musicbox?

Vai ser muito básico: serei eu a cantar e a tocar guitarra, mas vou tocar canções mais velhas dos Fiery Furnaces, canções do meu disco a solo e algumas versões. São aquelas coisas que me dizem muito nesta altura.

Entrevista: Bruno Martins