Oub'lá

Beatbombers

“Hoje já temos uma fórmula e sabemos o que é que vai resultar melhor nos campeonatos”

 

Era um triunfo desejado há muito: os Beatbombers, a dupla de DJs formada por DJ Ride e Stereossauro, voltaram a sagrar-se campeões do mundo de scratch e turntablism nos IDA World DJ Championships na final que aconteceu no dia 3 de dezembro em Cracóvia, na Polónia, repetindo a vitória que já tinham alcançado em 2011.

Já em Portugal, e com os dois troféus orgulhosamente apresentados nas paredes lá de casa, conversámos com a dupla sobre os desafios de participar nestes campeonatos, sobre as diferenças entre preparar um set de competição e criar um disco, sobre a longa amizade que os une, desde as Caldas da Rainha, e sobre os desafios para 2016.

Já é um hábito os Beatbombers participarem em campeonatos mundiais de scratch e turntablism. O foco é o mesmo todos os anos ou a exigência aumenta de competição para competição?

Stereossauro – Uma das coisas mais importantes é encontrar novas técnicas e novas estéticas musicais para mostrar sempre qualquer coisa de novo todos os anos. Mesmo que tenhamos tido uma boa classificação no ano passado, o júri lembra-se do que já fizemos e estão à espera que tenhamos elevado a barra.

DJ Ride – Se fores lá várias vezes e não sentirem que evoluíste, júri encara isso como desleixe. Não te dão uma boa pontuação e nem te levam tão a sério.

Então quer dizer que os vossos sets nos campeonatos do mundo começam sempre com uma folha em branco?

DJ Ride – Sim, temos sempre ideias, mas no início era um pouco mais difícil de montar coisas, porque também não tínhamos tantos recursos. Hoje já temos uma fórmula e sabemos o que é que vai resultar melhor nos campeonatos. Também já contratámos pessoal para gravar coisas para nós remisturarmos, pedimos pistas a bandas, para podermos produzir de forma diferente e mostrar material exclusivo. E participar num campeonato é muito viciante. Aprende-se muito. Quando se acaba o campeonato sentimos uma grande evolução. Olhando para trás, a nossa reta de progressão tem sido enorme.

 

“Para o IDA houve uma preparação muito maior: começámos a produzir três meses antes, fomos para as Caldas da Rainha, para a casa do Stereossauro. Fechámos o set e conseguimos estar um mês a treinar já a treinar o que fomos depois apresentar”

 

Bem que tentaram, eu sei. Mas porque é que não conseguiram revalidar o título entre 2011 e 2016?

Stereossauro – A componente de subjetividade é muito importante. É uma forma de arte. O que para nós pode ser sonicamente brutal e com grande técnica, pode não o ser para um júri. Aliás, nem costuma haver unanimidade nas decisões do júri. Podemos ir com sets muito fortes e não ganhar, mas experiência que ganhamos ao longo dos anos é muito importante para saber ir com frieza. Se estivermos muito tempo a treinar o set, podemos saber que vamos fortes, mas nunca podemos ir com o rei na barriga.

Sentem que podem ter ficado, em determinada altura, a dormir à sombra do título?

Stereo – Pelo contrário!

DJ Ride – Isso não aconteceu porque tentámos defender o título logo no ano seguinte. Poderia ter acontecido se tivéssemos ganho uma vez e nos retirássemos. Somos gajos malucos! Habitualmente, a malta ganha uma vez e no ano seguinte vai ser júri. Mas nós não: fomos logo à bruta outra vez para tentar ganhar!

Stereossauro – Também costumamos analisar o nosso trabalho e as outras participações com um sentido crítico. Mesmo aquelas em que ganhámos ou ficámos perto, percebemos onde podíamos ter sido melhores de uma ou de outra maneira. O set com que este ano fomos campeões já não tem muito das primeiras ideias! Claro que as primeiras já podiam ir nesta direção, mas depois, com a evolução, podíamos descobrir uma música com mais potencial e abandonávamos o que já tínhamos feito. É assim que se vai afinando para melhor.


A participação dos Beatbombers no campeonato DMC, onde ficaram a três pontos da vitória

Com que distância é que começam a trabalhar para os campeonatos?

DJ Ride – Este ano tivemos dois campeonatos: primeiro o DMC, em junho, em que ficámos a três pontos da vitória. E só depois o IDA. São campeonatos muito semelhantes: as regras são outras, mas o DMC é mais antigo e o IDA é mais independente.

No fundo, o ideal é ganhar os dois!

DJ Ride – É o que nós queremos! Este ano também tivemos muito mais tempo a preparar. Para o DMC dissemos que íamos começar logo a treinar em janeiro, mas é claro que isso não aconteceu. Só lá para março é que começámos a trocar umas ideias e só quando olhámos para a agenda e vimos que faltava um mês e meio é que o trabalho começou a fluir. Apareceram umas ideias muito porreiras, que ainda não tínhamos explorado, como as sonoridades e marching band, mais acústicas. A abordagem foi fazer uma coisa mais minimal, com base de bombo e tarola e o resto dos instrumentos a ser lançados pelas nossas mãos. Fluiu tudo muito bem e mais ninguém acabou por explorar estas sonoridades. Para o IDA houve uma preparação muito maior: começámos a produzir três meses antes, fomos para as Caldas da Rainha, para a casa do Stereossauro, onde tínhamos mais espaço para montar um setup maior: dois pratos para cada um, duas mesas, ele no sampler e eu com mais um teclado. Foi bom porque fechámos o set e conseguimos estar um mês a treinar já a treinar o que fomos depois apresentar.

 

“Quando o nosso deadline começou a apertar, passei uma semana inteira no YouTube, sem treinar o scratch, à procura daquele sample de um ou dois segundos, mesmo a partir a cabeça. Acho que se não fôssemos produtores, isto não corria tão bem!”

 

Muito trabalho de casa, então. Quando chegaram à Polónia, foi quase de olhos fechados?

Stereossauro – Mais ou menos! Mas estava muito bem treinado.

DJ Ride – Essa Isso foi a grande diferença. A preparação costuma ser três ou quatro meses e juntos uns dois meses a treinar um com o outro.

Foi a grande lição deste campeonato?

DJ Ride – A preparação e a produção. Mais com este tipo de produção mais minimal.

Stereossauro – Eu não posso dizer que esta forma de trabalhar tenha sido só neste campeonato. É uma coisa dois últimos dois ou três anos. As nossas vidas profissionais é que também não deixa ter assim tanto tempo para ensaiar: um está a tocar num sítio e outro no outro…

DJ Ride – E depois no dia a seguir um gajo está cansado e já nem tem tanta cabeça para ir criar. Hoje, para fazer este trabalho, tem que ser com mais preparação e com mais treino.

Distinguem o lado artístico do lado competitivo?

DJ Ride – Não. Como o objetivo desta categoria em que participamos é mostrar uma música, acabamos por conseguir-nos expressar mais. Este tipo de coisas até nem podemos fazer muito nos sets que fazemos em discotecas, para pôr o pessoal a dançar.

Stereossauro – Mas o sermos “party DJ” também é importante! A presença em palco é muito trabalhada. Mesmo não tendo usado músicas muito conhecidas, com a exceção da “Firestarter”, dos Prodigy, o set tem faixas muito up tempo que poderíamos passar numa discoteca até às 2 da manhã!

 

“Sermos ‘party DJ’ também é importante! A presença em palco é muito trabalhada. Mesmo não tendo usado músicas muito conhecidas, com a exceção da “Firestarter”, dos Prodigy, o set tem faixas muito up tempo que poderíamos passar numa discoteca até às 2 da manhã!”

 

E os discos? É muito diferente o foco com que têm de estar para um campeonato do da produção de um álbum?

Streossauro – É e não é! Muitas vezes, na produção de um disco, utilizamos muitas técnicas de turntablism. Em ambos os casos, estamos bastante à vontade no campo da produção.

DJ Ride – É uma mais-valia que temos. Nós a editar… bem, não quero parecer pretensioso, mas na edição somos mesmo “cromos”! Vamos buscar samples ao YouTube, procurar pequenos detalhes. Por exemplo, em comparação, nos campeonatos, há equipas que contratam produtores e equipas de masterização – e isso para nós até é um bocadinho de batota. A equipa francesa tinha pistas dos C2C!

Stereossauro – Nós somos meio “geek” ou “nerds” da tecnologia. Mas também da música: fazemos uma pesquisa muito intensiva.

DJ Ride – Olha, posso dizer que quando o nosso deadline começou a apertar, passei uma semana inteira no YouTube, sem treinar o scratch, à procura daquele sample de um ou dois segundos, mesmo a partir a cabeça. Acho que se não fôssemos produtores, isto não corria tão bem!

 

Em 2017 vai haver disco de Beatbombers. “Já o estamos a preparar desde 2015: há bastante trabalho começado e estamos a planear quais as músicas que podem levar ou não vozes”

 

Já começam a planear 2017? Mais discos? Mais competições?

DJ Ride – Vai haver álbum de Beatbombers!

Stereossauro – Já o estamos a preparar desde 2015: há bastante trabalho começado e estamos a planear quais as músicas que podem levar ou não vozes.

DJ Ride – E temos muitos vídeos, com muito material inédito da preparação para o campeonato, que queremos publicar. É uma espécie de Beatbombers TV!

Stereossauro – Quanto aos campeonatos… São três competições: IDA, DMC e Red Bull Thre3Style, mas no caso do IDA já recebemos convite para sermos júris no campeonato, por isso, provavelmente, no próximo ano vamos sentar-nos na cadeira mais relaxados a avaliar!

Entrevista: Bruno Martins


Recorda DJ Ride e Stereossauro na Antena 3, em 2012